Por Dartagnan da Silva Zanela (*)
“Não há lugar para a sabedoria onde não há paciência”.
(Sto. Agostinho)
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Parlando sobre a educação, sobre o ex ducere em seu sentido originário, não temos como nos esquivarmos das considerações tecidas por José Ortega y Gasset em seu livro Unas lecciones de metafísica. Neste, o filósofo espanhol simplesmente nos lembra do óbvio ululante: o que define o que somos é aquilo que fazemos enquanto um reflexo de nosso estado interior. Ou seja, o que define um estudante é o desejo ávido por estudar. Ponto.
Ponto, porém, esse abre espaço para muitas vírgulas que merecem a nossa atenção. Não no que tange a atitude tomada pelos outros, sejam eles alunos, professores ou mesmo pais, mas sim, no que essas pontiagudas palavras têm para versar a respeito de cada um de nós.
Isso mesmo. Via de regra, toda essa tigrada que adora passar pito nos outros sobre a importância da educação e o quanto que nosso país carece de investimento na área, nunca deu realmente a devida atenção à sua própria educação. Na verdade, nunca, nem de longe, deram para sua própria educação a importância que eles morbidamente evocam com suas pífias palavras quando possam de “otoridades” no assunto.
Sei que essa questão é colocada em segundo plano em nossa sociedade, todavia, isso não a retira de seu lugar prioritário na hierarquia dos valores. Educação, meu caro Horácio, não é uma questão de Estado e, por isso, não há política pública que dê conta de esgotá-la. Educação, gostemos ou não, discordemos o quando quisermos, é e sempre será uma questão pessoal movida pela força volitiva que impulsiona o indivíduo na direção do objeto almejado. Neste caso, a plena realização de si através do conhecer.
Bem, no caso de nossa sociedade, no nosso caso, em especial, o que move os indivíduos não é, literalmente, a busca pelo conhecimento, pela plena realização. O que nos move é algo que venha atestar que somos detentores de um determinado conhecimento, mesmo que nunca o tenhamos procurado.
Esse atestado de ignorância auto impingida apresenta-se com os mais variados nomes. São títulos que servem muito bem para o empavonamento curricular, mas que tem pouca valia no reino da sapiência.
Creio que um dos símbolos mais claros deste aspecto bárbaro de nossa cultura seja o desdém pelos livros que existe, pari passu, à idolatria que se alimenta em torno dos títulos e diplomas. Quando lemos a obra Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, temos diante de nossas mãos um claro retrato dessa doença que afeta a alma brasileira, quando vemos a estranhamento e as críticas proferidas por uma senhora sobre o fato de Policarpo possuir muitos livros em sua casa sem ao menos ser um bacharel, sem ao menos ter um parvo diploma na parede de seu lar.
Aliás, lembro-me, como se fosse ontem, quando se teve o início do surto febril por cursos de pós-graduação lato sensu em todo o país, em especial neste Estado da Federação, voltados para profissionais da seara da educação. Lembram-se? Pois é, então me digam uma coisa, qual foi o principal impulso motivador da procura desses cursos? Ah! Um relativo incremento salarial. Interessante! E o que mais chamava a atenção dos participantes? O conteúdo ministrado no mesmo ou a velocidade com que se poderia findá-lo? Hum! Fascinante esse tal amor, à brasileira, pelo saber, não é mesmo? Tão encantador quanto o teor estético dos diplomas pelos quais nos alienamos.
Em consonância com o que acima descrevemos, creio que as palavras do filósofo Olavo de Carvalho, presentes em sem seu artigo Educação ao contrário, publicado no Diário do Comércio em 27 de janeiro de 2009, são profundamente esclarecedoras e, ao mesmo tempo, provocativas.
Bem, o professor Carvalho diz-nos: “Clicando no Google a palavra ‘Educação’ seguida da expressão ‘direito de todos’, encontrei 671 mil referências. Só de artigos acadêmicos a respeito, 5.120. ‘Educação inclusiva’ dá 262 mil respostas. Experimente clicar agora ‘Educar-se é dever de cada um’: nenhum resultado. ‘Educar-se é dever de todos’: nenhum resultado. ‘Educar-se é dever do cidadão’: nenhum resultado”.
Que horror! Mas isso não é obrigação do Estado? Tudo bem, mas como o Estado pode dar algo que ele não tem? Como podemos cobrar algo que francamente não desejamos? Como podemos chamar de direito algo que não nos dispomos de corpo e alma para obter?
Tchó de Deus! Mas eu não estou falando de diplomas e certificados! Estou falando de educação. Sim, temos muita oferta de diplomas na praça (e até mesmo de instrução de qualidade), mas quantos estão realmente dispostos a se tornarem estudantes zelosos e devotados? O silêncio (ou a revolta) interior diante desta indagação muito nos esclarece sobre a gravidade do presente problema. Por isso ouçamos, ouçamos o silêncio que clama por nossa atenção.
(*) Professor e bebedor de café.
e-mail: dartagnanzanela@gmail.com