Por Bruno Zampier

Na arena do cenário político moderno, duas vertentes ideológicas antagônicas travam uma batalha interminável. Uma delas faz da igualdade seu princípio norteador; contrapondo-se a ela, a segunda clama pela liberdade. Trata-se, evidentemente, da esquerda e da direita, respectivamente. Julgando pela aparência deste campo de batalha, o cidadão sente-se convidado a assumir uma posição, quase como que convocado a tomar para si os desejos, os projetos e as dores de um dos lados da guerra. Pois estes dois princípios –  igualdade e liberdade -, na verdade, são caminhos que conduzem para um terceiro, a justiça.

Desta forma, o cenário político encontra-se organizado para que o Estado seja o instrumento supremo da justiça. Mas sempre acontece algo para frustrar este nobre ideal. Tão logo a esquerda assume o poder, logo vem a direita, denunciando a corrupção, a ineficiência administrativa, os conchavos ilícitos de sua adversária, a direita; e tão logo a direita assume o poder, a fórmula se repete. E no fim, nada se realiza, nada funciona. E a culpa sempre recai no adversário político: “o ideal não foi alcançado porque a esquerda (ou direita) é… “ e aí chovem adjetivos.

Haveria algo de estranho neste arranjo político e social? O cidadão parece intuir que algo está faltando neste esquema, mas, incapaz de identificar e nomear a essência do problema, mantém-se na ilusão de que o problema é meramente a corrupção ou as conspirações e conchavos da vertente adversária.

O que acontece, digamos logo, é que o esquema da política moderna – um ringue onde direita e esquerda se digladiam indefinidamente – não foi criado para fortalecer a sociedade em si mesma, mas para fortalecer o Estado.

O Estado é um arranjo artificial e burocrático, uma instituição mecânica e hierárquica, onde o sujeito encontra um terreno propício para formar alianças e provocar inimizades, garantir sua vaga e sua permanência, e não raro, corromper-se até os recônditos da alma ao ponto de não mais se reconhecer. A sociedade é um arranjo muito mais amplo, formado naturalmente pela convivência humana, onde o sujeito encontra terreno propício para a cultura, a religião, a formação de uma série de costumes que norteiam um código moral e ético baseados em uma tradição. Na sociedade, a política nasce naturalmente, enquanto articulação comunitária para a realização do bem comum.

Entretanto, tudo o que caracteriza a sociedade, falta no esquema entre a direita e a esquerda, pois a representatividade política da sociedade só ocorre aí de forma muito limitada, quando excepcionalmente, encaixa-se nos interesses do jogo político ou vem a calhar como propaganda no ano eleitoral. A sociedade, enfim, por sua própria natureza, não cabe no Estado moderno, da mesma forma que o oceano não cabe em nenhuma construção humana.

Consequentemente, a igualdade da esquerda, não é a igualdade conforme a natureza das coisas, mas a igualdade que o Estado, conforme o esquema político do momento, pode fornecer; da mesma forma, a liberdade da direita não é a liberdade conforme a natureza das coisas, mas a liberdade que o Estado, conforme o esquema político do momento, pode fornecer. É uma questão de conveniência e oportunidade, não de natureza e realidade. Se ainda não ficou claro, digamos logo: direita e esquerda são braços do Estado, não da sociedade. É preciso compreender que há nisso grande diferença. Pois o Estado é aquela construção artificial que dá vazão aos comportamentos mais vis, na luta por poder, dinheiro e fama. Nem sempre ele existiu (é uma criação do século XVI) e, muito antes dele, a sociedade já havia florescido magistralmente.

No próximo artigo vou apresentar alguns exemplos que esclarecem e provam este fato: na luta dialética entre esquerda e direita, o Estado sempre sai fortalecido. Deixo para o próprio leitor a tarefa de buscar nas suas lembranças e no noticiário do dia, situações em que, ao resolver um problema criado pela direita, a esquerda criou um outro problema ainda maior; por sua vez, ao resolver este novo problema, a direita acabou criando um terceiro problema, dando oportunidade a uma nova ascensão da esquerda, e assim por diante, em uma dialética infernal, em que a sociedade sempre acaba sufocada com impostos, corrupção e ineficiência, enquanto que o Estado é cada vez mais forte, invasivo e violento.

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