“Não peço aumento de efetivo, peço que me deixem fazer o meu trabalho e quem tem que cuidar de preso, que cuide” delegado Rodrigo
Por Nara Coelho | Foto:Arquivo/Fatos do Iguaçu
Após o latrocínio ocorrido no dia 30 de outubro em Pinhão e os protestos da comunidade, a equipe de reportagem do Fatos do Iguaçu conversou com o delgado Rodrigo Cruz dos Santos sobre as condições de trabalho da Polícia Civil.
Fatos do Iguaçu: O assaltante Samuel é um prisioneiro que foi solto com tornozeleira eletrônica, esse fato dos presos “saírem com facilidade” dos presídios tem provocado muito questionamento da população.
Delegado: Sobre isso, nós, da policia civil, militar não temos influência, nosso trabalho aqui é investigar, encaminhar ao judiciário. Na verdade, nem o judiciário tem o que fazer, pois ele segue a lei. O que pode ser questionado são as leis. Hoje, o preso cumpriu os requisitos, ele receberá o beneficio de sair com tornozeleira eletrônica, até porque nossos presídios estão superlotados.
Fatos do Iguaçu: Em situação de assalto, se a vitima sente que há condições favoráveis, ela deve reagir?
Delegado: Não. Nunca vai haver condição favorável para a vítima, o ladrão não tem nada a perder, ele está pronto para atirar. Veja no caso do latrocínio, a família toda pulou nos dois assaltantes, eram cinco contra dois, mas o que estava armado começou a atirar e aí aconteceu a tragédia. O ladrão não pensa, ele simplesmente atira, nesse caso, inclusive, a tragédia podia ter sido muito maior. A reação da vitima será sempre menor à ação do criminoso.
Fatos do Iguaçu: muitas pessoas no Pinhão acreditam que os menores já se organizaram, fala-se, inclusive, do comando São José, por exemplo. Existe realmente essa organização?
Delegado: a nossa experiência e observação mostram que os menores infratores falam muito, mas não são organizados, não há um comando. Eles falam muito para assustar as pessoas, tipo “primeiro comando do São José”, mas não há um chefe que coloque uma ordem que todos os dias eles têm que roubar e que determine o que se deve roubar, que é o que caracteriza uma associação criminosa. Os grupos existem, eles ameaçam, às vezes até matam, mas não são vinculados ao crime organizado, não são estruturados ao ponto de ganhar dinheiro e viver dos roubos, são todos muito pobres e ganham muito pouco com os crimes que cometem. Eles se reúnem em uns cincos piás e fazem o barulho com os facões, e decidem fazer um roubo, mas muito no oba oba, sem organização. No crime organizado, o individuo rouba todo dia, é profissão. Porque os ditos “Carçudos”, foi o povo que os denominou, inclusive eles não gostam que os chamem assim. E os “carçudos” da Bitur não conhecem e não se misturam com os carçudos do São José.
Fatos do Iguaçu: Qual é a estrutura da policia civil hoje?
Delegado: infelizmente, hoje, a estrutura da polícia civil é precária, a equipe é reduzida, normalmente as investigações são feitas por mim e um investigador. Por exemplo, nesse caso do latrocínio, houve o apoio da policia militar à P2, que é o serviço reservado da policia militar, para investigar casos militares, mas como eles têm uma equipe bem maior, veio nos ajudar na investigação, e isso foi importante para a solução do caso. Mas é triste saber que nós não podemos fazer nosso trabalho por falta de estrutura.
Fatos do Iguaçu: A comunidade tem pedido e trabalhado para a vinda de uma Companhia da Policia Militar para Pinhão, isso de fato fará a diferença em relação à segurança pública?
Delegado: quando falamos em assassinato, e principalmente aqui, que quase sempre são passionais, ou em brigas de bêbados nos bares, você pode ter um policial em cada esquina, que não vai conseguir evitar. Mas no caso de roubo ou latrocínio, faz a diferença. Porque o que leva o indivíduo entrar numa residência para roubar, mesmo sabendo que de lá vai levar muito pouco, é a certeza que não vai ser pego, da impunidade. Neste aspecto, a vinda de mais policiais ajuda, porque as prisões acontecerão com mais freqüência, isso leva o individuo a pensar duas vezes antes de cometer o crime, tira a ideia de impunidade.
Fatos do Iguaçu: A vinda de um batalhão vai beneficiar o trabalho da Policia Civil?
Delegado: Se continuarmos na situação que estamos, tendo que cuidar dos presos em vez de realizar o nosso trabalho, na verdade, a situação vai se complicar. Porque policia na rua é gente presa, pelos mais banais aos mais graves crimes, a nossa cadeia comporta 16 presos e está com 50. Hoje nós mais cuidamos de preso do que investigamos os crimes acontecidos, que é o nosso papel. Se aumentar o número de presos, ai de vez que não vamos conseguir investigar os crimes.
Fatos do Iguaçu: O que é preciso fazer para melhorar a estrutura da Polícia Civil?
Delegado: É preciso entregar toda essa estrutura da cadeia para o departamento penitenciário, é preciso vir agentes penitenciários para assumirem essa cadeia. Inclusive, estruturando-a melhor. A Polícia Civil ser transferida para outra estrutura física, que pode ser uma casa alugada de três quartos. Nós ficaremos dedicados só a investigar. Hoje, às 18h, quando a delegacia fecha, um dos investigadores tem que ficar de plantão por causa dos presos. Como os investigadores trabalham em sistema de plantão, que é trabalhar de 24 até 48 horas diretas, acabamos tendo sempre um investigador a cada dia aqui na delegacia. Para piorar, o investigador de plantão atende a um crime, mas após o plantão ele tem direito a sua folga. Quando ele volta para a investigação, já se passaram vários dias do crime, o trabalho fica todo quebrado e quase inviável de se realizar. Se não tivermos que cuidar dos presos, que não é nossa função, eu e os 4 investigadores, com certeza daríamos conta do trabalho, até porque se sairmos do sistema de plantão, os 4 estarão aqui todos os dias.Não peço aumento de efetivo, peço que me deixem fazer o meu trabalho e quem tem que cuidar de preso que cuide, que é o sistema penitenciário.