Quando as ruas das nossas cidades eram rigorosamente vigiadas, sacudir, para a via publica: tapetes, carpetes… e até simples pano de pó, era expressamente proibido.
Quem não cumprisse a Lei, sofria pesada multa.
Meu pai, devido à doença, que vitimou minha mãe, contratou criadita, para realizar o meneio da casa – casarão de alforge com dez quartos! – Reservou, porém, à esposa, a alegre tarefa de confecionar as refeições.
Apesar de avisada, esta, habituada a lidar em moradias da província, sacudia descuidadamente, tudo ou quase tudo, à janela, sem se preocupar com quem passasse no passeio.
Certa ocasião, ao sacudir o pano de pó, não reparou, que bem defronte ao prédio, estava, parado um polícia dos antigos, daqueles que não perdoava a multazinha…
O guarda logo interrogou a vizinhança, com o fim de se inteirar da atrevida. Disseram-lhe que a casa era do Senhor Máriozinho…
– Máriozinho quê?! “- Interrogou o janízaro.
– Não sabemos – responderam as mulheres.
Mas, a mais expedita informou: que o Senhor Manuel, dono da mercearia devia saber.
Todo lampeiro, o polícia entrou na loja, de nariz empinado.
O senhor Manuel ouviu-o atentamente e informou-o:
– É o senhor Mário Pinho. Homem de peso; e muito considerado…
– ” É homem de peso ?! – Interrogou o agente de autoridade, estampando no rosto, expressão de receio.
– Sim: e até escreve nos jornais!…
– “Ah! muito obrigado…Muito obrigado. Se é homem de peso e escreve, é melhor esquecer a multazinha…
Mais tarde, meu pai, ao conhecer o diálogo travado com o merceeiro, comentava, sentado à mesa oval, de mogno polido, onde tomávamos as refeições:
– ” Realmente sou homem de peso… Peso oitenta e dois quilos…”
Assim se livrou da multa.
Somos todos iguais – dizem os entendidos, – mas há uns, mais iguais, do que outros…
A lei é para todos. A justiça é cega… Mas, já dizia o nosso clássico Padre Manuel Bernardes:
” As leis são como as teias de aranha. Se cai nela uma pedra, rompe-a, e fica ilesa; se cai nela a mosca, fica presa, e paga o seu descuido ou atrevimento. Assim os grandes zombam das leis, e o castigo de se quebrarem, fica só para os pequenos.”
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