O historiador Lucien Febvre nos ensina que o conhecimento histórico não pode, de jeito maneira, ser apreendido com automatismo, como se esse fosse processado de forma similar às engrenagens de uma máquina rudimentar. Nada disso. O conhecimento histórico deve sempre, necessariamente, ser problematizado. Todo escrito histórico deve apresentar-se como história-problema, nunca como um ponto final.

Bem, é importante, antes de qualquer coisa, esclarecer que o ato de deitar as vistas num escrito desse feitio, de uma história-problema, não é de modo algum similar a essa mania pueril de ficar procurando chifres em cabeça de cavalo que acabou por tomar conta da cumbuca de muita gente. Não mesmo.

Aliás, como bem nos adverte o velho ditado popular russo: um único idiota é capaz de levantar tantas questões [idiotas] que nem mesmo mil sábios seriam capazes de responde-las. Bem, a história-problema não procura levantar esse tipo de encrenca.

Dito isso, sigamos com o andor: problematizar algo seria simplesmente o ato de levantar as perguntas apropriadas sobre um determinado assunto e, frequentemente, as perguntas apropriadas são tremendamente inapropriadas, diga-se de passagem.

Para realizar tal empreitada, necessariamente, precisamos nos inteirar minimamente sobre o tema e, é claro, conhecermos um montão de outras coisinhas e coisonas sobre outros assuntos para, dessa maneira, sermos capazes de formular de forma minimamente justa algumas questões que irão nos auxiliar em nossa jornada solitária pela procura do dito cujo do conhecimento e isso, meu caro Watson, dá trabalho.

Na verdade, não temos como falar que estamos genuinamente conhecendo algo se nós não procuramos formular de forma zelosa os problemas que nós desejamos resolver com nosso [suposto] desejo por esclarecimento.

Dito de outro modo, se eu não formular as perguntas que irão nortear minha curiosidade [ociosa] por um reto caminho, sem nos darmos conta, corremos o risco de acabar tendo nossa ociosidade [frivolamente curiosa] sendo guiada por questões maliciosamente formuladas por outras pessoas. Pois é. E quando isso ocorre, o leite azeda de vez.

E, para engrossar um pouquinho mais esse angu, esses problemas, bem ou mal formulados, por terceiros com segundas intenções, acabam invariavelmente vindo com a resposta prontinha para o problema que foi malandramente proposto por eles.

Por essa razão a construção do conhecimento histórico não deve jamais ser encarada como sendo apenas uma mera superposição de dados. Claro, isso tem lá o seu valor e utilidade, mas não é o ponto final da jornada que nos leva a edificação do conhecimento.

Por isso, todo aquele que garbosamente se autoproclama um “amante” da história deveria saber que a Clio, a musa da história, a “mestra da vida”, é aquela que levanta as perguntas, fundamentais, para lembrar os filhos do tempo presente os feitos e atos que não podem ser esquecidos para que, desse modo, possamos, no tempo presente, ampliar o nosso horizonte de compreensão.

Aliás, é bom lembrar que todo conhecimento, em todas as searas, principia com a formulação de perguntas que devem ser respondidas por nós mesmos, com a profundidade que nossa alma é capaz de almejar.

Bem, diante dessa obviedade ululante, podemos nos perguntar: quantas vezes em nossa vida nós procuramos formular uma lista de questões, mesmo que modesta, sobre um assunto que nós gostaríamos realmente conhecer com alguma profundidade? Quantas listas de livros nós elaboramos com os títulos que podem nos auxiliar na resolução dos problemas que foram levantados por nós através de uma série de perguntas? Quantas vezes em nossa vida nós procuramos realizar algo assim, por livre e espontânea vontade? Quantas mesmo? Pois é.

Por essas e outras que expressões como “conhecimento crítico” e “consciência crítica”, em nossa sociedade, são totalmente esvaziadas de sentido, da mesma forma que é destituído de autoridade todo aquele que ama encher a boca para dizer que os outros devem estudar história, sem realmente problematizar aquilo que ele, enquanto indivíduo “crítico”, [supostamente] sabe a respeito da dita cuja.

E isso é assim porque, se nós mesmos não formulamos as questões que irão nortear de forma reta a nossa ânsia por conhecimento, acabaremos caindo num fosso de frívola curiosidade ociosa e terminaremos agrilhoados a questões formuladas por pessoas cuja a intencionalidade nós desconhecemos totalmente, mesmo que insistamos em crer de forma tola no contrário.

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela

https://sites.google.com/view/zanela

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