Tornou-se um lugar comum, já faz um bom tempo, afirmar que a reprovação de um aluno, por este não ter atingido os pré-requisitos mínimos necessários, seria uma prática retrógrada, ultrapassada, e que a defesa de tal expediente seria uma atitude que estaria sinalizando uma grande falta de sensibilidade e empatia para com os educandos e suas dificuldades e limitações.

Tal afirmação além de ser falsa do princípio ao fim é, também, muitíssimo maliciosa.

Primeiramente, afirmar que algo é retrógrado é um dos ardis retóricos mais antigos e malandros da história. Quando afirmamos que algo tem esse perfil, não estamos colocando-o no centro da mesa de debates para avaliar os seus pontos positivos e negativos, muito pelo contrário, estamos simplesmente tirando-o, para todo o sempre, de qualquer mesa de discussão, pois o que é tido na conta de ultrapassado não se discute, simplesmente se descarta.

Por isso, sem medo de ser rotulado como sendo um caboclo retrógrado, digo que reprovar um aluno, que não atingiu os pré-requisitos mínimos necessários, é algo indispensável para que o sistema de ensino possa apresentar resultados minimamente bons, da mesma forma que nós, em nossa vida, quando vamos tomar uma decisão, realizar uma escolha, fazemos inúmeras reprovações, pois, quando preferimos algo, inevitavelmente, preterimos alguma coisa.

Aliás, o que diríamos de um sistema de saúde que desse alta para todos os seus pacientes, independente do que estaria sendo indicado pelo resultado dos exames que foram realizados pelos médicos? Pois é. Podemos dizer o mesmo de um sistema de ensino que ignora a realidade que é apresentada, de forma escancarada e escandalosa, para todos aqueles que se recusam a tapar o sol com as estatísticas oficiosas.

Em segundo lugar, todo aquele que não dispensa uma apelação emocional, para justificar as suas escolas, é porque, infelizmente, não tem a menor sensibilidade para o drama que é realmente vivido pelas pessoas.

Dito de outro modo, todos aqueles que falam, três por quatro, da importância da empatia nas relações de ensino e aprendizagem e que, por isso, condenam de forma veemente a reprovação, justificam sua “opção preferencial pelos reprovados”, dizendo que existem várias formas de aprender e bem como de avaliar. Na verdade, bem na verdade, o que estão querendo dizer nas “entrelinhas” é que eles não se importam se os alunos estão realmente aprendendo ou não. Se importam, sim, com os números que são maquinados nas maquininhas de distrações, mas não com o que realmente está sendo feito com a vida de incontáveis infantes.

Quando afirma-se que um estudante, que não atingiu os pré-requisitos mínimos necessários, deve reprovar, não se está afirmando que o abençoado deverá ser condenado à danação eterna. Não. Nada disso. O que está sendo dito com isso, de forma silente, é que nós nos importamos com ele, que nos preocupamos com a forma displicente que ele encara suas responsabilidades, que estamos atentos e angustiados com a falta de zelo que ele imprime aos seus estudos, que não há um caminho fácil para superarmos nossas dificuldades e que, tudo isso, cedo ou tarde, acaba por ter sérias consequências na vida de qualquer pessoa se não for encarado com a indispensável serenidade.

E tem outra. Quando reprovamos, estamos tendo a oportunidade de provar, para nós mesmos, que nós somos capazes de atingir esses pré-requisitos mínimos que estão sendo solicitados e, ao fazer isso, estamos exercitando a virtude da perseverança, da superação e, deste modo, estaremos crescendo em espírito e verdade.

Agora, quando se procura fazer vistas grossas em relação ao aprendizado, não apenas estamos dizendo, com essa atitude, que não nos importamos com o destino que está sendo desenhado a grossos traços para as tenras gerações, mas também, e principalmente, estamos induzindo os mancebos a cultivarem o mau hábito do jeitinho, da crença de que sempre haverá alguma autoridade superior que, no frigir dos ovos, irá colocar panos quentes sobre os erros que levianamente fomos praticando e isso, francamente, é a própria negação da educação, a afirmação da perene imaturidade.

Isso mesmo. Se todos estamos de acordo que educar é um ato de misericórdia, não apontar os erros e não procurar chamar o praticante dos erros para o caminho reto, admitamos ou não, é um descarado ato de impiedade que praticamente se institucionalizou entre nós.

Dito de outro modo, como hoje em dia não são poucas as pessoas que confundem a misericórdia com o bom-mocismo, é mais do que natural que muitas pessoas confundam o uso de palavras melosas e politicamente corretas com a prática do amor ao próximo que, neste caso, seria o ato de educar o aluno e não apenas a tentativa vã de parecer um cara legal perante eles.

Por essa e por outras razões que a reprovação não é um trem retrógrado, mas sim, um dos alicerces da educação, pouco importando se estamos ou não com um tablet em nossas mãos.

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela

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