Por Bruno Zampier
No último artigo comentei sobre a capacidade que as vertentes opostas do espectro político tem de multiplicar problemas e soluções, sempre inovando no discurso e prometendo um mundo melhor. Mas o resultado nunca é satisfatório. Agora, vamos a alguns exemplos.
Para começar, voltemos aos anos 60, quando diversos artistas, jornalistas e políticos tornaram-se mais incisivos na defesa de propostas autoritárias de esquerda. Muitos fizeram treinamento de guerrilha em Cuba (veja-se o livro de Denise Rollemberg: “O Apoio de Cuba a Luta Armada no Brasil”) e passaram a realizar assaltos (que eram chamados de atos de expropriação”), atentados terroristas e diversos outros atos de violência. A resposta da direita, como sabemos, foi a ditadura militar, que permaneceu no poder por praticamente 20 anos, tudo com o apoio da grande mídia.
Quando o regime militar passou a sinalizar que cederia o poder para o retorno à “normalidade democrática”, alas mais radicais do exército se revoltaram. Foi então a vez da direita realizar atos terroristas, como o atentado do Riocentro e a explosão na sede da OAB, que na época ficava no Rio de Janeiro. Foi assim uma dialética de violência: do desejo de uma ditadura de esquerda, triunfou uma ditadura de direita; de atos terroristas da esquerda, passou-se a atos terroristas da direita.
Então veio a democracia e uma nova Constituição foi promulgada. Dessa vez, a esquerda assumiu o controle, com o retorno de diversos artistas e políticos exilados, entre eles Leonel Brizola, eleito governador do Rio de Janeiro. Com muito discurso vitimista e populista, a Constituição apresenta um rol extenso de garantias fundamentais, mas também faz do Estado o ente central da organização da sociedade brasileira, como ensinam as cartilhas marxistas. Ali encontramos vasto fundamento para a tributação infernal que nos é imposta, sempre com a desculpa do projeto de “redução das desigualdades”.
A saúde, na Constituição, é considerada como “direito de todos e um dever do Estado”, assim como a segurança pública. Para garantir tudo isso, impostos e mais impostos, projetos e mais projetos, ministérios, secretarias, campanhas e propagandas. No fim, nada disso funciona, o povo fica à míngua e, quem pode, contrata uma empresa de segurança privada para proteger sua casa e paga um plano de saúde particular. Assim, do fracasso da proposta neoliberal dos militares, a esquerda encontrou uma fonte de justificação para uma constituição socialista, e, a partir daí, sucedem-se eleições e mais eleições, onde os candidatos apresentam suas propostas como se fossem opostas, mas, na verdade, estão apenas escolhendo dispositivos constitucionais que não só permitem, mas exigem que o titular do poder executivo e legislativo apresente projetos que sempre vão ao encontro das metas socialistas.
E a grande mídia – o leitor deve saber de quem falo especificamente – que antes lucrava com o governo militar da direita, agora lucra com o governo da esquerda. Para o STF, os presidentes de esquerda nomeiam ministros sempre alinhados com o pensamento socialista, simpatizantes dos movimentos extremistas de sindicatos e reforma agrária. Chega-se a nomear um ministro que sequer foi aprovado em concurso para a magistratura, mas que fora advogado do PT… tudo sem que a sociedade sequer tivesse forças para reagir e protestar.
Mas eis que a esquerda então se afunda em denúncias de corrupção e empréstimos bilionários a nações estrangeiras governadas por socialistas. Descobre-se também o “mensalão”: imensas somas em dinheiro, pagas mensalmente a parlamentares corruptos, de forma sistemática, para garantir a aprovação de projetos do governo. Não que isso não tenha existido sempre até nas câmaras municipais, mas o fato é que, o que antes era uma desvio para favorecimento pessoal, agora se tornava uma prática sistematizada, elevada a condição de estratégia central de governo. Cai o governo de esquerda e um militar assume a presidência, eleito democraticamente.
Agora, os esquemas de “rachadinha” dos filhos do presidente parecem boca pequena perto do “mensalão” e muitos cidadãos se veem obrigados a preferir o mal menor a arriscar a retomada do poder por uma esquerda ainda mais corrupta. No STF, fala-se em nomear um ministro “terrivelmente evangélico”, o que causa escândalo nos extremistas da esquerda, que se esquecem que a nomeação de seus ministros se deu por critérios ideológicos e não por critérios técnicos.
A rigor, quem resta desamparado na infernal dialética entre direita e esquerda é sempre o povo. Seja para instaurar um governo autoritário, para formar uma constituinte ou para nomear um ministro, direita e esquerda estão sempre jogando uma disputa pelo poder, em que atender os reais interesses da população, embora também necessário, depende do filtro da conveniência do momento. Se direita e esquerda representam os elementos dialéticos da liberdade e da igualdade em busca da justiça, é de se questionar por que esse objetivo nunca é alcançado. E a resposta emerge das raízes da modernidade: a política moderna baniu a submissão à verdade como critério último de decisões governamentais. Liberdade e igualdade sem a verdade, são, em essência, prisão e arbitrariedade.
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