Por Dartagnan da Silva Zanela (*)

Não chore o leite derramado. Assim reza o ditado popular. Pois é, mas como no Brasil conselho dado é óbolo desprezado.

Ao invés de encarar-se os pequenos infortúnios da vida, de encarar aqueles reveses que quando são vistos na perspectiva da alma imortal são ridiculamente insignificantes, com um mínimo de dignidade e resignação, prefere-se entrega-se, na maioria das vezes, a mais vergonhosa auto piedade, clamando-se soberbamente para que tudo e todos realizem pelo suplicante aquilo que ele em nenhum momento se dispôs fazer por si.

Outra coisa: não apenas isso. Cada queda, cada tombo que levamos em nossa vida podem ser vistos como um momento para refletirmos sobre os erros cometidos por nós, para ponderarmos sobre nossa vida e, inclusive, sobre os caminhos que escolhemos seguir nesse ou naquele momento de nossa existência.

(Tais reflexões podem e devem ser feitas não apenas com os nossos tropeços, mas também, e por que não, a partir dos de outrem para também aprendermos com a experiência alheia)

Por isso, e por muitas outras razões, que não se deve lamentar o leite derramado. Deve-se sim iniciar uma nova ordenha ou outra atividade.

Mas isso não é fácil não, haja vista que não estamos insatisfeitos, na maioria dos casos, com o que somos (ou éramos), mas sim, com aquilo que temos (ou perdemos).

Ora, na primeira forma de insatisfação nos leva a tornarmo-nos pessoas mais dignas, prestativas e boas. Descontentamento esse que nos elevar de dignidade e verdade.

Já a segunda, dum modo geral, nos torna muitas vezes uma pessoa avarenta (mesmo sem nada ter), rancorosa e invejosa, reduzindo-nos à condição duma pessoa vaidosamente satisfeita com sua nulidade e movida frivolamente pela vã cobiça.

Por isso, o dito popular é certeiro no que diz: não choremos o leite derramado. Procuremos, com o auxílio da Providência, sermos maiores que as quedas e tropeços que vez por outra a vida nos apresenta e, acima de tudo, desejemos ser melhores, almejemos ser pessoas mais fortes, independente de quais sejam as nossas posses.

Caso contrário, pode-se continuar sendo um pusilânime na alma, um verdadeiro adulto infantilizado e moralmente mimado, sempre desgostoso com o rincão que está à seus pés e mui, mui confortável com o seu coração de geleia e papelão.

(*) professor, cronista e bebedor de café.

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