Nessa reportagem vamos contar um pouquinho da história de um piá de serraria, que é filho de uma das famílias pioneiras de Pinhão.

Um pinhãoense da gema

Thadeu com o neto Aaron | Foto: reprodução Facebook/ Jacir Thadeu

A nossa entrevista que fala do início da formação do município foi um passeio pelo Pinhão da década de 60 e 70.

O empresário que hoje enche os olhos de alegria quando fala que é avô do Aaron, tem muito orgulho de ter nascido e se criado na serraria Santa Terezinha. “Sou, e com muito, orgulho piá de serraria”. Assim se define Jacir Thadeu Ferreira Dellê, proprietário das farmácias Água Azul.

Bisavô foi pioneiro

Thadeu contou de forma muito carinhosa que seu bisavô, Luiz Alexandre Dellê, era imigrante.

Quando chegou ao Brasil era muito jovem, mas já percebeu que o país oferecia várias possibilidades.

“O comércio é bem enraizado na minha família. Desde que o meu bisavô aqui chegou, viu no comércio um leque de possibilidades. Ele negociou a erva-mate. Vinha buscar mercadoria no interior para vender no litoral e capital”.

Nessas idas para o interior em busca de mercadorias, o bisavô do Thadeu chegou até a comunidade de Pinhão, na época Vila Nova.

“Ele chegou até Pinhão e se encantou. Na época tinha por aqui entre umas 50 a 100 casas. Aqui ele se fixou e montou uma casa de comércio”.

O avô Francisco Dellê

Seu Luiz Alexandre teve seus filhos. Dentre eles, o avô do nosso entrevistado, o senhor Francisco Dellê. “Meu avô montou a casa de comércio Irmãos Dellê e teve 11 filhos, e os 11 deram sequência no setor comercial”.

Os 11 irmãos diversificaram

 “Eles tinham serraria, posto de gasolina, transportadora, casa de comércio. Faziam aquisição dos produtos extrativistas e comercializavam em outros centros maiores”.

Thadeu nos contou que o seu pai Jacir Dellê, ao se casar com a sua mãe Juraci Ferreira Dellê, decidiu levar uma filial da Casa de Comércio Irmãos Dellê para uma comunidade.

“Meu pai, quando casou, optou por montar uma filial do comércio para  a serraria do Zattar, na  comunidade de Santa Terezinha. Dentro da Serraria havia um armazém das Indústrias Zattar, mas meu pai montou a filial na entrada da serraria”.

Um piá de serraria

“Eu nasci lá na serraria. Meu pai já estava com o armazém lá e só saí de lá aos 18 anos para estudar. Meus amigos de infância e juventude são da serraria e lá era uma vida muito pura, simples. Jogo de futebol no final de semana, nadar no riozinho, pescar lambaris, estilingue no pescoço, tirando pinhão, comendo fruta silvestre. Minha personalidade foi formada numa comunidade de serraria, sou piá de serraria”.

O Armazém

Thadeu, com seu jeito tranquilo, vai contando sua vivência na serraria. Mas, mas quando começa a contar sobre o armazém da família, a emoção é visível no brilho dos olhos e na voz.

“Me lembro muito bem de como era o armazém. Tinha desde alguns remédios, que na época era permitido vender, a ferragem, tecidos. A sessão de tecidos era uma sessão muito bonita, peças inteiras…”

Ele faz uma pausa na fala como se estivesse vendo a sessão…” Também tinha confecções, ferragens, produtos de armarinho, louças, aviamentos. Me lembro que as pessoas chegavam e pediam: quero um retrós número tal. Vendia também arma de fogo: as espingardas, pólvora, chumbo, espoletas, munição para revólver. Mas, principalmente, vendia gêneros alimentícios a granel. As pessoas entregavam a lista do que iam levar para o meu pai e ele ia pesando e arrumando as compras”.

No Natal, toda a família trabalhava

O piá de serraria que se tornou um empresário, conta que o pai Jacir Dellê tocava o armazém sozinho, uma vez ou outra tinha um ajudante, e que a mãe era uma costureira de mão cheia, mas, que em algumas ocasiões, toda a família ia para o mercado ajudar.

“Época do natal vem muito na minha  memória o armazém, meu pai chegava e dizia: – Preciso de todo mundo, é início do período de natal! Era movimento fantástico, o dia todo era trabalhado. Pesar e embalar produto era comigo e o meu irmão. Minha mãe ia para a parte de tecidos e o meu pai no caixa e gerenciando tudo o resto”.

Um ponto de encontro

A casa de comércio Irmãos Dellê em Santa Terezinha era um ponto de encontro.

Era lá que os homens se reuníam para ouvir os jogos de futebol no rádio que o seu Jacir Dellê tinha no armazém.

“Toda a comunidade da Santa Terezinha ia lá ouvir o rádio e, no dia de jogos, os homens se reuniam lá. Era muito comum eles chegarem e pedirem uma pinga, uma lata de sardinha, um pacote de farinha e um prato. Eles colocavam a sardinha na farinha e iam comendinho, bebendinho, conversando e ouvindo o jogo no rádio”.

Na serraria surge um cruzeirense

Tadeu é torcedor desde pequeno do Cruzeiro, que é um time mineiro.

“Meu pai era anti Santos porque o Santos massacrava a Portuguesa Desportos, o time dele. Nos anos 60, ganhava tudo. Era a época do Pelé, Pepe, Coutinho. Em 1968 deu uma final do brasileiro entre Santos e Cruzeiro e a comunidade inteira da serraria era  Santos. Meu pai torceu para o Cruzeiro por ser contra o Santos. Eu, vendo meu pai torcer para o Cruzeiro, torci junto. O Cruzeiro ganhou, o meu pai continuou torcedor da Portuguesa, e eu fiquei cruzeirense, (muitos risos)”.

Duas faculdades

O piazinho da serraria cresceu e seus pais o direcionaram para continuar os estudos. “Eu não queria estudar. Queria morar mais no interior que eu morava, tocar o armazém. Mas meus pais diziam que eu tinha que melhorar de alguma forma e decidiram que eu devia continuar os estudos”.

Ele conta que, de começo, não sabia que curso ia fazer na faculdade.

“Quando comecei a fazer o cursinho, não tinha escolhido o que ia faze. Queria algo na área da saúde ou curso técnico para lidar no comércio. De repente, tive a visão: farmácia, pois envolve a área da saúde e o comércio. Assim, escolhi fazer Farmácia”.

Uma paixão: o esporte

Além de amar morar na serraria, da lida no armazém, Tadeu tinha outra paixão: o esporte.

“Me criei jogando bola e, quando fui fazer o ginásio, eu era meio fascinado pelas aulas de educação física, pelo  futebol, corrida, as disputas. Eu curtia bem, fazia bem”.

O rapaz do interior era dedicado nos estudos e concluiu que podia aproveitar bem o tempo que estava estudando.

“Eu só estudava, não trabalhava e fazia uma faculdade pública. Nos dois últimos anos me sobrava tempo. Resolvi usar esse espaço vago para fazer a faculdade de Educação Física. Eliminei várias matérias teóricas que eram comuns aos dois cursos e assim fiz  Educação Física em 2 anos. Conclui as duas  faculdades juntas”.

A Família

Thadeu terminou a faculdade em 1979 e voltou para o Pinhão e, como ele mesmo disse, “Numa mão o diploma e na outra a Margarida”, sua esposa.

Ele conta que com a ajuda dela, já sua noiva na época, foram organizando a vida.

Em 1983 casaram e ela sempre esteve ao seu lado. “A Margarida sempre me ajudou na farmácia, hoje é que ela está mais na boa vida”.

Dessa união, que já tem 38 anos de convivência, cumplicidade e a construção de uma família, vieram 3 filhos: Ulisses, Raul e Lais.

Dois decidiram seguir os passos do pai na farmácia e um escolheu se envolver com a propriedade rural que a família tem.

“Eu me orgulho de ter me estruturado de forma que meus filhos se formaram e saíram trabalhando. Eu saí do zero e formei uma pequena estrutura. Ela é modesta, mas bem articulada para que as coisas acontecessem dessa forma.

Eu lembro deles pequenos, na dúvida do que fazer na faculdade. Eu nunca direcionei. Fui observando a tendência que eles tinham e, quando o mais velho manifestou que queria fazer Farmácia para me ajudar, eu aceitei, mas não pressionei. Digo para eles: “deem sequência no que construímos até aqui. Hoje o mercado está muito mais disputado, mas os dois farmacêuticos estão trabalhando no que é deles, isso é que é importante”.

O Raul fez veterinária. Quando ele observou que nós tínhamos uma estruturinha modesta que ele podia melhorar e aplicar os conhecimentos dele na família, ele fez. E hoje trabalha para ele e na agricultura aproveitando as nossas áreas, defendendo os interesses deles”.

Farmacêutico e Professor

“Durante 12 anos conciliei as duas profissões. Não era fácil, mas era bem trabalhado. Duas coisas que eu gostava. E já diz o ditado: se você faz o que gosta, você não sente o peso do trabalho. Mas eram duas grandes responsabilidades e tive que escolher. E escolhi a farmácia por considerar que era a que iria no futuro me dar mais sustentabilidade econômica”.

Se valeu a pena ter sido professor, a resposta vem rápido: “Valeu a pena! Eu estou parado mais de duas décadas, mas até hoje eu saio na rua ou vou atender meus clientes no balcão e eles me chamam de professor. Ainda me relaciono com os  meus colegas de magistério. Foi muito bacana, faria de novo”.

A Farmácia Água Azul

Ao voltar formado, ele encontrou uma pequena estrutura na qual a família tinha investido.

A primeira farmácia ele montou com a prima Selenita Dellê, que também tinha feito a faculdade de Farmácia. Mas, depois de um tempo, se separaram.

E aí nasceu na rua XV de Dezembro, a Farmácia Água Azul, que em 18 de fevereiro de 2022 fará 35 anos.

A Farmácia Água Azul, das pioneiras, é a única que se manteve. Não só se modernizando como gerando uma filial na avenida Trifon Hanycsz.

“Recebi uma estrutura pequena, mas a gente desconstruiu aquilo e começamos do zero. Eu ganhei um ponta pé inicial, mas a trajetória toda a gente construiu para que fosse o que projetamos enquanto estudante. Com a identidade da gente, usando a tecnologia e modernização que foi aparecendo, mas com a tradição que já tínhamos no início”.

Comércio, sua  Modificação

“Sou pioneiro, pois hoje eu sou a primeira farmácia do Pinhão, a mais antiga em funcionamento. De lá para cá, muita coisa mudou, desde a forma de trabalhar à organização do estabelecimento.

No início, o público era de um  vilarejo, cidadezinha. Hoje é de uma cidade, as cobranças são maiores, as pessoas se tornaram mais exigentes. Elas selecionam mais os estabelecimentos que querem fidelizar.

Eu tinha o Pinhão todo como cliente, éramos só dois estabelecimentos comerciais. Hoje, são muitos no meu ramo. É  preciso batalhar mais para fidelizar e, sem uma clientela fidelizada, numa cidade do porte de Pinhão, você não sobrevive.

O fluxo de pessoas aqui no meu local restringiu. Eu estava no centro há 35 anos. Hoje, eu estou na periferia. Aqui era centro, ali onde são os bancos o Pinhão meio que acabava. Hoje não, dali pra lá que a cidade se desenvolveu”.

Funcionários

Foto: Naor Coelho/Fatos do Iguaçu

Foto: Naor Coelho/Fatos do Iguaçu

As duas farmácias que estão sob o comando da família do farmacêutico Thadeu geram 17 empregos.

“É uma realização poder contribuir, gerar esses empregos, e  me esforço para não diminuir. Temos momentos difíceis, mas com trabalho e perseverança acreditamos que vai melhorar”.

Pinhão em 1969

“Eu vim estudar aqui em Pinhão em 1969, molequinho. Eu lembro bem nitidamente como Pinhão era.

Tinha a igrejinha de madeira, a coletoria do seu Renato Passos,  a casa da dona Mariquita, o hotel do seu Serafim Ribas.

Pinhão começava na serraria do Mansur, que depois virou serraria da produtora, e terminava ali no hotel do seu Serafim, que é onde moram os filhos dele. Dali pra lá era mato, a saída para Guarapuava era estrada de chão.

Nós vínhamos estudar aqui, eram 7 km a pé. Às vezes de bicicleta ou de carona nos caminhões do Zattar, chegávamos pela Vila Caldas, não tinha o trevo. Ali era um matão, eram as chácaras dos Kinceler,  tinha uma estradinha antiga, que tem até hoje, que vai até  a Santa Terezinha. A saída para Guarapuava era uma estradinha de terra.

Tinha duas casas, a do Orquiza, mais pro interior e dos Muhlstedts, na subidinha dos pastos da nhá Fidencia. As casas eram raras.

Pinhão cresceu

Até uma década atrás Pinhão cresceu normalmente, como todas as cidades do Paraná.

De uma década para cá, ele vem crescendo acima da média na região.

Não se instalaram grandes industrias. Na verdade, as madeireiras que mais empregavam fecharam. Eu digo  que, possivelmente, foi o agronegócio que deu um suporte maior, não só grandes investidores que tem grandes áreas, mas principalmente o pequeno produtor rural.

Ele valorizou a terra dele, ele investiu, e as políticas dos governos deram suporte a essas pessoas.

E eu diria que uma empresa que deve ser muito valorizada no Pinhão, que deu sustentabilidade para o pequeno, é a Coamo. Ela tem um peso fundamental nessa valorização do homem na terra.

Falta em Pinhão

Segurança. Nossas autoridades têm que olhar com muita atenção para esse setor, pois cabe aos mandantes organizar a segurança, nós somos contribuintes!

Para que isso ocorra, as rédeas da situação não estão em nossas mãos, mas nas dos governantes.

Parabéns, Pinhão!

Escolhi Pinhão para ser meu ponto de partida e quero que ele seja de chegada também!

Quando temos essa parceria, você sempre deseja o melhor. Eu desejo que Pinhão corresponda  à expectativa que nós, pinhãoenses da gema temos.

Que aquelas pessoas que vêm de fora para investir, apostar aqui, também encontrem em Pinhão esse amigo, esse parceiro que dê retorno para todas as expectativas que criamos em torno dele.

Mas, pra isso, para que uma cidade seja bacana, é preciso ter bons cidadãos. Sem bons cidadãos não tem cidade que seja boa.

Eu vejo muita dificuldade em ter uma cidade bacana se as pessoas não valorizam o que tem na cidade. É preciso que façamos a nossa parte.

 

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