O presidente Associação Quilombola Pró – Reintegração Invernada Paiol de Telha – Fundão, João trindade Marques assina o recebimento de duas partes de área | Foto: Fatos do Iguaçu/Fatos do Iguaçu

Quilombolas lutam para manter a posse da terra e viabilizar a continuidade da titulação do território tradicional. Julgamento em Porto Alegre será dia 17.

Redação Fatos do Iguaçu com Assessoria

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) deve julgar, na próxima terça-feira (17), em Porto Alegre (RS), dois recursos sobre direitos territoriais da Comunidade Quilombola Invernada Paiol de Telha. Localizada em Reserva do Iguaçu (PR), a Comunidade é alvo de um pedido de reintegração de posse. Outro recurso trata da decisão que obriga o Estado brasileiro a destinar recursos ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para a titulação da integralidade do território. A sessão está agendada para as 10h.

Em maio deste ano o Paiol de Telha teve, após décadas de luta, parte de seu território titulado. No entanto, o título dá o domínio coletivo de apenas 225 hectares das terras que formam o território tradicional, uma extensão ainda muito distante dos 2,9 mil hectares reconhecidos pelo Incra como de direito da Comunidade.

Embora o Incra tenha reconhecido o direito à titulação da totalidade do território em 2014 e o decreto de desapropriação da área, em benefício da Comunidade, data de 2015, não há, no momento, expectativas em relação ao seguimento da titulação.

“A paralização dos trabalhos do Incra está relacionada à falta de orçamento e à oposição política de Jair Bolsonaro às titulações quilombolas”, aponta o assessor jurídico da Terra de Direitos, Fernando Prioste. As declarações do Presidente, de não avançar nenhum passo na titulação das áreas, a reconfiguração administrativa dos ministérios, com a pastas de responsabilidade da titulação sob comando de opositores à política quilombola, é objeto de denúncia internacional realizada pelo movimento quilombola e por organizações de direitos humanos.

Diante da paralisia do Incra no processo de titulação, a Comunidade Quilombola ajuizou, em outubro de 2018, uma Ação Civil Pública (ACP) para obrigar o Incra e a União a seguirem com o processo de titulação. Em março de 2019 a juíza federal Sílvia Regina Salau Brollo, da 11ª Vara Federal de Curitiba, concedeu liminar para obrigar a autarquia federal a titular uma área de 225 hectares, que já tinha recursos para desapropriação disponíveis desde 2016. A juíza ainda determinou que a União repasse ao Incra o montante de 23 milhões de reais, no prazo de 6 meses, para que seja dado seguimento à titulação.

A autarquia cumpriu a liminar e concedeu o título de parte do território. Contudo, a União recorreu da decisão que a obrigada a repassar recursos ao Incra, e a desembargadora Marga Tessler, do TRF4, acatou provisoriamente o recurso, argumentando que seria “incabível impor à União a disponibilização de vultosos recursos para a desapropriação de terras em tal cenário, sob pena de grave dano a outros projetos já previstos”. Desta forma, a determinação à União foi provisoriamente suspensa.

Ocupação de nova área
A lentidão dos trabalhos do Incra obrigou a comunidade, no final do ano de 2017, a ocupar mais uma porção de seu território, mesmo antes da titulação. A Comunidade, que conta com mais de 300 famílias, ocupou a área com o objetivo de viabilizar sustento digno. Sem acesso ao território as famílias quilombolas estariam em risco. “A ocupação não teria ocorrido se o Incra tivesse dado seguimento à titulação do território”, complementa Fernando.

A Juíza Federal Sílvia Regina Salau Brollo negou o pedido de reintegração de posse realizado pela Cooperativa Agrária, empresa proprietária das terras quilombolas, alegando que “A situação dos quilombolas mostra-se frágil, pois aguardam há muito tempo a demarcação de território a que, aparentemente, têm direito.

O INCRA, por inúmeros motivos ainda não finalizou o processo, não podendo, enquanto isso, os quilombolas terem violadas as mínimas condições de sobreviver com dignidade”. Contudo, a empresa recorreu e se o Tribunal acatar o recurso a comunidade poderá sofrer despejo forçado. Essa situação colocará a comunidade em situação de extrema vulnerabilidade social, pois poderá acarretar a destruição de casas, roçados entre outras estruturas comunitárias.

“Nos causa preocupação a reintegração de posse. Queremos pedir para juízes e órgãos competentes: nós não estamos invadindo terra de ninguém, estamos tentando buscar o que é nosso, que a gente já perdeu no passado, em 1975 já fomos expulsos daqui”, diz o quilombola José Maria Soares.

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