Professora doutora Liliana Porto | Foto: Arquivo/Fatos do Iguaçu
A professora doutora Liliana Porto do Departamento de Antropologia da UFPR e chefe da unidade de Cultura e Saberes Populares do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade Federal do Paraná, o MAE, que já desenvolveu vários projetos no municipio de Pinhão/Paraná e conhece a realidade da região, ao ler a reportagem, “Vila Residencial de Faxinal do Céu e Segredo em via de desativação”, sentiu a necessidade de se manifestar, a seguir o texto da professora Liliana Porto.
Desativação de Faxinal do Céu: irresponsabilidade social e ambiental
Liliana Porto
As notícias sobre a desativação da vila de Faxinal do Céu, em Pinhão/PR, nos fazem refletir sobre as responsabilidades do Estado e de empresas estatais tanto com as regiões em que atuam quanto com as pessoas que nelas vivem. A imposição de uma perspectiva exclusiva de mercado, sendo a única racionalidade considerada a econômica, leva ao esquecimento da história e desconsideração de grupos que foram e são afetados diretamente por processos dos quais não puderam sequer participar.
A construção, na década de 1970, da Usina Governador Bento Munhoz da Rocha Netto atingiu de forma decisiva o cotidiano de inúmeros moradores de Pinhão, ao desalojá-los não somente dos vários espaços alagados, mas também da região de Faxinal do Céu (que foi controlada pela COPEL para construção de sua vila residencial). Retirados de seu território, foram obrigados a se adaptar a novos contextos, inclusive trabalhando como assalariados no lugar que anteriormente constituía seu ambiente de vida.
Na década de 1990, a vila, já não mais necessária para o alojamento dos trabalhadores da COPEL, foi transformada em centro de atividades formativas para professores e outros grupos sociais, tornando-se referência em todo o estado do Paraná. Com uma infraestrutura sólida de alojamentos e espaços formativos, contando com um importante jardim botânico e com uma paisagem privilegiada, Faxinal do Céu permitiu, por algum tempo, que o governo paranaense desenvolvesse programas de capacitação do funcionalismo público e grupos sociais – programas esses com impacto nas áreas de educação, saúde, direitos humanos. Atividades que tiveram relevância estadual, permitiram àqueles que se formavam conhecer uma das regiões com maior preservação de matas de araucária do Paraná e, ainda, geraram centenas de empregos para os moradores locais.
Esta atividade, no entanto, também foi interrompida de forma abrupta, com grandes prejuízos para os moradores e para aqueles que tinham em Faxinal do Céu a oportunidade de aprimoramento de seus conhecimentos e formação. Nenhum projeto de compensação local, nenhuma busca de soluções junto à comunidade.
A desativação total da vila, anunciada, consolidaria o descompromisso estatal com todas as pessoas que foram atingidas ao longo desse processo, bem como com o patrimônio e investimento público consolidados no decorrer das últimas décadas. Os usos passados de Faxinal do Céu demonstram seu potencial, o lugar não pode ser tratado apenas segundo uma lógica de mercado para a produção de energia elétrica. Alternativas humanizadas e responsáveis devem ser buscadas para que o destino de Faxinal do Céu faça jus a sua história, a sua estrutura e àqueles que têm no lugar seu espaço de trabalho e de vida.