Artigo Dartagnan Zanela

Conta-se pelos estreitos corredores da história da vida literária nacional que, quando Rubem Braga já estava com uma certa idade, e com seu peso um tanto acima da média, começou a sofrer com fortes dores na paleta.

Ninguém merece isso. Quem enfrenta esse tipo de sofrência sabe muito bem do que estou falando.

Bem, por causa desse tormento lombar, Rubão resolveu procurar um homem de jaleco branco para dele obter uma opinião qualificada sobre esse incômodo assunto.

O Médico o examinou do jeito que manda o figurino e disse-lhe que o pobre homem tinha nada mais, nada menos, que quinze bicos de papagaio. Quinze. É mole ou quer mais? Melhor não falar nada.

Ao ouvir isso, naturalmente, o cronista dos cronistas ficou pau da vida. Quem não ficaria. Porém, Braga era um típico brasileiro e, enquanto tal, era fatalista e se adaptava facilmente as circunstâncias, fossem elas boas ou más. Com o passar do tempo o velho nem mesmo se queixava mais de suas dores. Até contava vantagem de seus quinze bicos de papagaio e, ao final, dizia: o que não tem remédio, remediado está. Meu Deus. Quinze.

Enquanto isso, do outro lado de Gotham City, estamos nós, os atordoados cidadãos de todos os dias, que também temos nossos bicos de papagaio que não estão, diga-se de passagem, nas nossas costas, mas sim, na coluna vertebral de nossas caquéticas repúblicas municipais. Nas Estaduais e na Federal também. E é cada calombo que, só por Deus.

E esses hematomas mais ou menos republicanos falam. Minha Nossa Senhora, como falam. Prometem mundos e fundos. Todos eles dizem, sem piscar, que se eleito forem irão aliviar nossa fatiga [depre]cívica, gerada pelo peso mastodôntico da incompetência historicamente sedimentada e politicamente adquirida.

Não apenas isso. Esses nódulos democráticos dizem que irão falar em nosso nome e que não mais teremos que esquentar a moringa com a lentidão burocrática que, em muitíssimos casos, tornou-se a justificativa mais que perfeita para a incorrigível falta de boa vontade que impera nessa terra de desterrados.

É cada coisa, cada história que chega aos nossos ouvidos que quase nos convencemos que os coitados são realmente pinicos.

E o pior de tudo é que nós, reles cidadãos atordoados pelas decisões e omissões de nossas “otoridades” eleitas, nos acostumamos com as dores nas costas da cidadania que tanto afligem nossa municipalidade. Como bons brasileiros, somos também meio fatalistas, cada um à sua maneira, de modo similar a Rubem Braga com seus bicos de papagaio.

Olhamos para essas figuras, cheias de pose e artimanhas e dizemos, sorumbaticamente, para nós mesmos, na alcova da nossa consciência: o que não tem remédio, remediado está.

Sim, esse fatalismo típico de nossa gente é de amargar porque a verdade sobre nossa sociedade não é nem um pouco doce não.

Infelizmente, qualquer atitude minimamente serena deve partir desse olhar fatalista que marca a alma brasileira. Ignorar esse traço marcante de nossa sociedade é literalmente fazer buraco n’água imaginado estar realizando uma grande mudança com essa atitude.

Gostemos ou não, as mudanças, tanto as boas quanto as más, são lentas. Elas não caminham na velocidade dos cliques do mundo digital. Não. O tempo delas é outro. Por isso, se realmente ansiamos vislumbrar um futuro alvissareiro para nossa municipalidade é de fundamental importância que tenhamos claro em nosso horizonte que não é através dum pleito eleitoreiro que iremos nos livrar dos bicos de papagaio que atravancam a vida cívica nossa de cada dia.

Penso que o primeiro passo nessa direção, do endireitamento geral de nossa coluna fatigada é reconhecermos que há, em cada um de nós, uma inclinação para o servilismo voluntário que nos leva a procurar um sinhô para podermos ter a momentânea ilusão de que todos nós iremos nos locupletar com o beneplácito dele.

O reconhecimento dessa chaga não significa que estaremos livres dessa tola e voluntariosa servidão. Nada disso. Apenas irá sinalizar com clareza contra o que devemos lutar, diariamente, porque o bom combate começa em nossa alma, não numa urna eletrônica cafona.

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela, um bicho do mato que gosta muito de uma boa xícara de café.

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