Humberto Silva Pinho

Por Humberto Pinho da Silva

Acabara de chegar a Florianópolis, vindo de São Paulo, quando liguei o aparelho de televisão.

No ecrã, surgiu a imagem de conhecido político, que estava a ser entrevistado, em sua casa.

A determinado momento, a cordial conversa, resvalou para a necessidade das figuras públicas, conhecerem tudo, que se edita, de interesse, no país.

Animado pela amena conversa, o político, convidou o entrevistador, a visitar a sua biblioteca.

Era uma vasta sala, com duas janelas de guilhotina, pintadas a branco. As paredes estavam forradas a estantes de cor negra, repletas de livros, quase todos encadernados.

Ao centro da quadra, encontrava-se, antiga e pesada mesa, de pé-de-galo, envernizada. Pendente do teto de estuque, havia vistoso lustre de vidrinhos de várias cores.

Dispersos, pela sala fauteuis, estufados a azul, e espreguiçadeira de palhinha. Assim se resumia o sóbrio mobiliário daquela livraria, de milhares de volumes.

De ar doutoral, o entrevistado, passava orgulhosamente as pontas dos dedos, pelas lombadas, à laia de tocador de reque-reque, informando:

“Aqui, tenho tudo sobre economia!; ali, os livros de Direito!; acolá, encontram-se as obras completas dos nossos principais escritores!…”: e por ai adiante….

De boca escancarada de espanto, o atónito jornalista, olhava assombrado, as filas intermináveis de livros, todos perfilhados, todos alinhados, como soldados em parada.

Possuir grande biblioteca; comprar livros a metro, é sinal que se é culto?!

Claro que não. Que impressiona as turbas, e faz bem ao ego do vaidoso, não duvido…Jacinto, do Eça, possuía trinta mil volumes… que nunca os lera…

Deve-se ler muito ou pouco?

Sertillanges, recomenda moderação na leitura, porque: “ A leitura desordenada, não alimenta, entorpece o espírito. “ (A Vida Intelectual)

E o célebre Jean Guiton, é do mesmo parecer: “ Levado ao extremo, não se havia de ler senão um único livro, na vida.”

E acrescenta: “ Convêm ter sempre à cabeceira, aqueles que a qualquer momento, nos podem proporcionar um conselho.”

Assim fazia Camilo – Mestre dos Mestres, segundo Vasco Botelho do Amaral, – que, nas suas andanças, acompanhava-o, sempre, a “biblioteca de campanha”.

André Mourois, em: “ Carta Aberta a um Jovem”, após recomendar os clássicos, declara: “ Sugiro-lhe uma biblioteca de campanha, reduzida a sete escritores: Homero, Montaigne, Shakespeare, Balzac, Tolstíi, Proust, Alain. No dia em que os conhecer perfeitamente, quero dizer, até ao pormenor, você será um homem culto.”

Todavia, Inace Leep, na: “ A Arte de Viver do Intelectual”, diverge, em parte, desse parecer. Referindo-se aos jovens, escreve: “ Não vejo qualquer inconveniente em que um jovem amador de literatura, leia, desordenadamente, quase tudo: romance de todos os géneros, biografias, história e geografia, divulgação científica e mais tarde, obras de filosofia e teologia. Um certo ecletismo não só é lícito como também muito desejável num primeiro estádio do desabrochamento intelectual.

“Quase todos os intelectuais com quem tive ocasião de falar a este respeito dizem ter seguido este processo e ter lucrado muito com ele. O único critério de seleção, sobretudo no que respeita às obras literárias, deve ser o valor artístico.”

Mas…na mesma obra, diz: “ Não é por ter lido muito e saber muitas coisas, que se é um intelectual autêntico. Importa ainda saber julgar o que se leu e aprendeu, viu ou ouviu.”

Azorin, considera, também, que a leitura é inútil, se não houver meditação, sobre o que o livro nos diz:

“ No se medita en el mundo moderno. Hay muy pocos hombres que se plazean en la meditación; sin la meditación (…) faltará la perspectiva espiritual, esa segunda realidade que, a su vez, hace meditar al lector de un libro.” – “ El Escritor”

                    Mais adiante, Inace Leep, em: “ A Arte de Viver do Intelectual”, recomenda a escolha de um mestre, advertindo:

“ O homem de um só livro é facilmente sectário (…) também é muito perigoso ser-se discípulo de um só e único mestre.”

“ Dedica-te ao mestre que escolheres, com afeto, sim, mas sem fanatismo ou exclusividade.”

E noutro passo, recorda o prazer de reler: “ Chegará o dia, Daniel, em que também experimentarás a sensação de aprender mais, relendo os mesmos livros, ainda que poucos numerosos, de grandes mestres, do que lendo as últimas novidades de livraria.”

Se as obras, em regra, se repetem, para quê ler muito? Não será melhor, buscar na densa floresta dos livros, os que nos agradam: pelo estilo e pelo tema?

Montaigne, passava dias, até meses, sem abrir um volume…folheava-os; lendo trechos ao acaso. (Ensaios)

Para pensar e raciocinar bem, é imprescindível, ler grandes pensadores. Porque baseamos os nossos pareceres, no que disseram os outros: no presente, e no passado.

Ler obras fundamentais, que são as que alimentam o espírito, e as que nos fazem pensar, deve ser o nosso guia.

Karl Jaspers, aconselha: Não Convém ler muito e variar constantemente de leitura; deve-se sobretudo, aprofundar fielmente as obras capitais  –  “Iniciação Filosófica”.

Livros há, que despertam interesse na adolescência, e são indiferentes na idade adulta. Cada idade tem sua leitura.

Há ensaios magníficos, que merecem ser lidos; mas, não são facilmente digeridos, por falta de preparação. Melhor é ler autores mais acessíveis, do que tentar assimilar os herméticos.

Os clássicos, são sempre recomendáveis. Eça, lamentava-se, de só muito tarde os ter descoberto.

As obras indicadas pelos críticos e editores, podem não ser – a meu ver, – as melhores. Por vezes são até contraproducentes, culturalmente e moralmente. O que é bom, para eles, pode não ser para nós…

Ser leitor de um só autor, ou de um só livro, também, não me parece recomendável, para não se cair nos “ vícios” do escritor; a não ser que seja a Bíblia: que não é um Livro… mas muitos…

Em suma: punhado de livros, bem escolhidos, é melhor que vasta biblioteca, que raramente é lida… e, quase sempre, serve apenas, para engalanar estantes.

Os pareceres exprimidos nesta crónica, foram baseados em reconhecidos pensadores, do século XX. Servem apenas de orientação. Cada um deve escolher o método, que for melhor para si.

Meu, só há o mérito – se é mérito, – de ter feito de abelhinha, colhendo opiniões, de reconhecidos intelectuais. Nada mais.

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