Claudia Tomacheski

O Fatos do Iguaçu, que sempre acreditou nas mulheres e sempre deu vez, voz e visibilidades a todas elas, não podia deixar o mês de março passar em branco, contará a história de 3 mulheres, e, através delas, dizer a todas as Mulheres: Vocês são demais, podem tudo e realizam muito.

A nossa primeira mulher é uma bela e competente advogada criminalista, que tem muito orgulho de suas raízes.

Foto: Nara Coelho/Fatos do Iguaçu

Cláudia Tomacheski, 33 anos, mãe de dois lindos piás, que já superou vários obstáculos e preconceitos. É determinada, muito positiva, daquelas que o mundo pode estar caindo, mas, ela continua afirmando, vai dar tudo certo.

É imediatista e ansiosa…ansiosa…ansiosa, é tímida, não curte aparecer, mas sabe e muito bem ocupar o seu espaço, traz a alegria como companheira, muita disposição para ir além e atrás dos seus sonhos, mesmo que precise se reinventar, coisa que já aprendeu que é possível.

Infância

Claudia é pinhãoense, filha do casal de agricultores Maria de Lourdes e Claudio Antônio Tomacheski, com as irmãs Renata e Vera Diana e o irmão Marcelo, cresceu fazendo daninheza na comunidade do Guarapuavinha.

Foto: Arquivo/Pessoal

Ela falou de forma muito carinhosa dessa infância” Nossa vida era simples, não saáamos muito, era muito gostoso receber os primos, os tios, o vô e a vó, era uma festa. Tive uma infância bem simples, porém, muito feliz, nossa característica é ser e estar em família, sempre muito unidos”.

O incêndio

A infância de Claudia foi feliz, mas, um momento marcou sua vida e de sua família.

Em 2000, com 11 anos, Claudia viu sua casa, que foi construída com muitos esforços pelos seus pais pegar fogo.

Naquela época, no município não havia bombeiro e nem telefonia móvel para chamar por socorro, só restou à família ver a casa com menos de 5 anos de construção ser consumida pelas chamas,  “Esse momento foi bem difícil, até hoje eu não consigo falar desse fato sem me emocionar, só consegui superar após alguns tratamentos”.

Os tempos que vieram depois foram difíceis, “Foi muito triste e difícil superar, a minha família passou por muitas dificuldades, meus pais sempre viveram da terra, tudo que tínhamos era construído aos pouquinhos”.

As perdas materiais foram grandes, porém, a perda das lembranças machucou mais, “As fotos se foram, como se foi o vestido de noiva da minha mãe e tantas outras coisas… (uma sombra de tristeza surge no olhar). A única coisa que pudemos fazer, foi ficar olhando e vendo queimar”.

O fogo ensinou o desapego

“Tive que descontruir esse trauma e a barreira em relação aos bens materiais.  A minha mãe perdeu todo o apego, hoje nada é guardado, a toalha ou louça nova é usada no dia-a-dia. Eu sou assim também, afinal, eu não sei o dia de amanhã, tudo pode simplesmente acabar”.

Amizades fizeram a diferença

Claudia abre um sorriso tímido e vem um brilho no olhar quando conta “Sempre participamos da comunidade e na época tivemos muita ajuda da comunidade, conseguimos nos reerguer”.

“Tenho muito orgulho da minha origem rural”

Foi no Guarapuavinha que ela aprendeu a lutar pelos seus direitos e  se preocupar com o bem comum.  “Eu só sai de lá com 17 anos, meu caráter e valores se formaram naquela comunidade, dentro da igreja fui catequista, trabalhava direto na igreja, tinha semana que eu ia todos os dias caminhando e nem percebia a distância”.

Claudia conta entre risos e um semblante de quem tem uma saudade danada de boa dos seus 15 anos.

Foi quando começou a participar e se envolver com as atividades do  Sintraf, da antiga Afatrup, Casa Familiar Rural. “A gente não estudava  lá, mas fazia parte dos projetos, participávamos de alguns projetos para o jovem rural, tanto que meu primeiro sonho de faculdade era fazer Agronomia. Era ficar na área rural, tenho muito orgulho da minha origem rural, ter crescido dentro dessas associações”.

A primeira viagem foi para participar de encontro do sindicato. “Fomos a Porto Alegre para participar de um encontro nacional. Nós não tínhamos muita noção da importância do caminho que estávamos construindo para nós e para os que viriam, muitas vezes nós estávamos encantados com as viagens, afinal, estávamos indo a Porto Alegre”.

Trabalhar fora, um sonho

“Trabalhar fora era um objetivo de vida, para poder ter as nossas coisas, porque éramos 4 filhos, pai e mãe na lavoura, não dava nem para sonhar em ter roupa nova, isso acontecia duas vezes por ano, na época de festa da igreja e no início do ano para ir para a escola. Tênis da moda nem pensar”.

Claudia complementa entre risos, “Nós não tínhamos grande ambições, queríamos estudar e trabalhar para ter nossas coisinhas”.

Pais, presença marcante

Foto: Arquivo/Pessoal

O olhar da Claudia brilha intensamente quando fala de seus pais “Estudar sempre foi muito incentivado na simplicidade deles, nunca nos obrigaram a ir para roçar, o discurso da minha mãe era sempre estude, estude, estude”.

Sempre tiveram apoio em tudo, “O pai nos trazia de fusquinha às 23horas no Escadão e vinha buscar às 3 horas da manhã, eu sempre estava na hora e lugar combinado, já a minha irmã, nem sempre (risos).

Entre a minha mãe e a minha geração tem um abismo, ela é um exemplo de mulher, do tempo dela, vê tudo e atende todo mundo, a visão de mundo dela é a partir da família, mas ao mesmo tempo seus conselhos são sábios, nos ensinou a viver nesse mundo a partir da simplicidade dela, ela é espetacular. Ela é doce, gentil.

Ser Gêmea

Foto: Arquivo/Pessoal

Claudia e a irmã Renata são gêmeas, “Hoje na vida adulta é muito mais tranquilo, ser gêmea chama a atenção, quando você é uma criança que vem do interior é muito tímida, tudo que você não quer é chamar a atenção, mas não passa despercebido. Me incomodava”

Ela conta um momento marcante na vida dela, “Nós usávamos as roupas juntas, um dos momentos mais difíceis para mim foi quando fui estudar fora e fomos separar as nossas roupas para eu levar”.

Mas ela afirma que ter uma irmã gêmea é ótimo, “É ótimo, foi muito difícil me separar da Renata, precisei de terapia, a Renata sempre foi mais desapegada, eu sofri anos até compreender que a vida dela era dela e a minha era minha”. “Hoje a gente se diverte muito com a questão de ser gêmeas”.

Agronomia

Claudia decidiu e fez na Unicentro vestibular para Agronomia, ficou em 28º lugar para 25 vagas. Porém, ela conseguiu uma bolsa de estudo para uma faculdade lá em Maringá e foi para lá, “Quando me vi lá sozinha levei um susto, não vou conseguir ficar, após uma semana em Maringá, saiu a segunda chamada da Unicentro, voltei correndo”.

Ela descobriu que Agronomia anda de mãos dadas com cálculos,” nunca fui dos números, ninguém me falou que tinha cálculos. Na minha primeira aula me deparei com um quadro cheio de cálculos a serem desenvolvidos, eu, gente, o que é isso?”

Além da dificuldade com as disciplinas, a vida de universitária era bem difícil, “Dificuldade financeira era grande, eu pegava o ônibus no Pinhão às 6 horas só voltava às 23h30, muitas vezes não tinha dinheiro nem para pagar um lanche que preste. Depois a Vera me ajudou a pagar um aluguel, ficou um pouco mais fácil”.

A difícil decisão

“Em fevereiro de 2009, criei coragem e disse para mim mesma, para a família, não dá, vou desistir, isso foi muito difícil, não tenho o hábito de desistir, mas eu tinha certeza que não queria voltar para lá”.

Como ela só desistiu em fevereiro, os vestibulares já tinham passado…

A União

Nesse ano, Claudia inicia a sua união estável com o noivo Gilson Teixeira Mendes, o Gil, “Fui morar com o Gil,  começamos a namorar em 2006, programamos que iríamos casar em 2010, junho de 2008 ficamos noivos, 6/03/2010 era a data do casamento.

Foto: Arquivo/Pessoal

12 de fevereiro de 2009 resolvemos morar junto, eu tinha arrumado emprego no Pinhão, e tinha que vir morar aqui, ele já tinha saído da casa dos pais. Meus pais me apoiaram”.

Ela conta que ouviu frases tipo, “Não vai voltar para a faculdade, já largou, agora, vai casar, nunca mais volta”.

Fatos do Iguaçu

Nesse ano Claudia inicia seu trabalho no Jornal Fatos do Iguaçu, “Trabalhei no Jornal 3 anos, foi uma experiência muito especial, cresci muito, tenho muito orgulho de contar que eu fiz parte da equipe do Fatos. Sai quando já estava na faculdade de Direito. Quando fui trabalhar lá, estava numa fase bem difícil, tinha perdido o emprego, tinha ido morar com o Gil, a gente pagava aluguel, tinha comprado as coisas para casa”.

Advocacia

Ela conta que resolveu fazer o concurso da prefeitura para professora e cursar  Pedagogia na Unicentro, “Na minha cabeça, era assim, faço o concurso vou fazer Pedagogia e vou seguir nessa área, passei em primeiro lugar em Pedagogia, a única coisa que eu não contava era não passar no concurso, entre risos… eu não passei”.

Foto: Arquivo/Pessoal

Ela sempre teve a irmã Vera como um modelo a se espelhar, com o incentivo dela fez o vestibular para Direito, que cursou com bolsa integral.

 Ser advogada

“Gostou muito, toda profissão tem seus altos e baixos, ser advogada é viver sob pressão, cada cliente é um chefe”.

Já conquistei meu espaço

“Tenho 6 anos de carreira, me sinto realizada, a Vera foi meu estímulo, meu exemplo, e hoje eu não sou mais a advogada irmã da dra. Vera, as pessoas já dizem a Dra Claudia, já tenho o meu reconhecimento, isso me deixa muito orgulhosa”.

Advocacia criminal

Claudia começou atuando na área trabalhista e família, “hoje não faço a trabalhista, me decepcionei demais”.

Ela tem atuado e busca seu espaço na área criminal,” Estou me especializando na área criminal, gosto, estou escalando essa área, conquistando meu espaço, no município temos já advogados reconhecidos, mas quero e vou ser também uma referência”.

Ser Mãe

Foto: Arquivo/Pessoal

Claudia é mãe de dois piazinhos lindos e sapecas, o Miguel  de 8 anos e Rafael de 4,“Ser mãe é especial, é realizador e desafiador, é viver o amor de forma intensa, é ter muitas alegrias e várias preocupações, ser mãe é inexplicável”.

O primeiro filho foi planejado

Mas veio no inesperado, “Eu estava no penúltimo ano da faculdade e planejamos engravidar, só não imaginei que seria tão rápido. Engravidei no primeiro mês que parei com o anticoncepcional. Tive que enfrentar a gravidez, o TCC, o exame da OAB, as atividades das demais disciplinas, as tarefas do meu trabalho, era um turbilhão de coisas. Engravidei em abril e o Miguel nasceu em janeiro, assim o penúltimo ano fiz grávida e o último foi aprendendo ser mãe”.

As pessoas de novo duvidaram que ela era capaz, porém, ela mostrou que se reinventar, enfrentar a vida de frente é com ela, “Cheguei na sala com a novidade da gravidez, um colega veio e comentou, “que pena, não vamos nos formar juntos”, perguntei, por que, você vai desistir? Porque eu não vou. Todo mundo caiu na risada na sala”.

Exame da OAB

E então veio o desafio de passar no exame da OAB, que a partir de 2014 os acadêmicos do último ano de Direito poderiam fazer o exame. “Passamos na primeira fase e conversando com um professor começamos a dizer que área do direito escolhemos para fazer a prova da segunda fase, quando disse que escolhi área civil, uma colega que ia fazer na área administrativa gargalhou e falou, “Eu achei que eu tava lascada, imagina você”.

Foi a única

Passamos em 6 para a segunda fase e eu fui a única que passei, tenho orgulho por isso, saiu o resultado, eu queria gargalhar, cheguei na sala nas nuvens, tipo quem foi mesmo que passou? Por isso fui a juramentista da turma”.

O preconceito veio delas

Quando perguntei a Claudia se ela vivenciou o preconceito do machismo, ela disse que sim, “Preconceito por ser mulher, por ser mãe. Dentro do Direito ele diminui, mas ainda existe. Já aprendi a lidar com isso, de chegar nos ambientes me impor. Acredito que nós mulheres já demarcamos o espaço e não permitimos mais que os preconceituosos se expressem, quando se expressam não nos atingem”.

Porém, o preconceito marcou a vida da advogada Claudia de maneira muito forte no período em que foi obesa e ele veio das mulheres, “O grande preconceito que eu senti foi quando eu era obesa, o preconceito era evidente, ele vinha das mulheres, dentro dos fóruns, sofri muito, a bariátrica foi a melhor coisa que fiz”.

Ela complementa “O preconceito de uma mulher com a outra é muito grande, eu sofri, muito para mim é bem difícil falar disso”.

Ser obesa

“Foram 12 anos de obesidade, essa realidade é muito triste, porque a gente se culpa, porque as pessoas olham para você e dizem que você não tem força de vontade, que não emagrece porque não quer, a realidade é outra, cada organismo é um organismo. Cheguei a 120 quilos”.

Bariátrica

A cirurgiã bariátrica não é simples, é uma decisão pessoal e complexa, ”Eu lutei muitos anos contra porque eu tinha muito medo. Quem me ajudou na decisão foi a Vera, ela tem muita importância na minha vida, numa conversa ela me disse, “Se para você ficar bem é o que tem que ser feito, vá lá e faça”.

Uma decisão sem apoio

Decidi fazer, o Gil me disse, “ você não precisa disso, é só fechar a boca”, mas não é assim, e decidi que faria com ou sem apoio. Mas depois que ele viu que ia fazer, me apoiou e foi comigo para Curitiba no dia da cirurgia”.

Renasci

Um ano após a bariátrica | Foto: Arquivo/Pessoal

“No dia 6/02/2019 eu renasci, fui fazer a cirurgia muito feliz, me maquiei, tirei uma foto, não estava com medo, eu coloquei na mão de Deus, se ele me permitiu estar ali é porque era para mim estar, quando me chamaram fui rindo como uma criança. Emagreci 35 quilos”.

Você é forte

 Pedi a Claudia o que ela diria à pequena Claudia de 7 anos lá no Guarapuavinha, “Você é mais forte do que pensa. Porque eu sempre fui muito dependente dos outros, penso que isso está ligado ao fato de ser gêmea, por muito tempo tomar decisões para mim era um pesadelo, mas a vida foi ensinando e na minha profissão tomar decisão é algo que preciso fazer muito, tudo isso foi me mostrando que eu sou muito mais forte do que eu acreditava”.

Ser Mulher

“Eu amo ser mulher, é fazer mil coisas ao mesmo tempo, eu, por exemplo, cuido da minha profissão, da imobiliária, da casa, da escola, das crianças, presto ajuda à minha família. A mulher é a base da sociedade, eu não sei o que seria do mundo se não fossem as mulheres, os homens não se viram para nada.

Se cuidar é importante

É muito importante que a mulher se cuide, eu aprendi que é preciso tirar um tempo pra mim, foi a melhor coisa que eu fiz por mim. E a gente tem que estar bem, porque senão, o mundo para (muitos risos)

Um recadinho para as mulheres

“Jamais abaixem a cabeça, jamais pensem que não são capazes, sigam em frente com determinação, porque a mulher pode estar onde ela quiser, todos os espaços são das mulheres, podemos fazer tudo que os homens fazem, e bem melhor, risos, sejam vocês mesmas e alcancem o mundo, porque ele é nosso”.

Sonhos

Consolidar como uma advogada criminalista e ser referencia, sinto que estou no caminho certo, criar meus filhos no caminho correto, dar conforto, repassar valores a eles.

Até aqui valeu a pena

 “Só valeu, teve muitos percalços, tropeços, dificuldade, mas tem valido a pena, estar aqui hoje lembrando quem eu já fui, de onde vim. Quando criança eu não imaginava que estaria aqui, tantas pessoas se perderam no caminho. Eu considero que vim muito longe”.

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