Bruno Zampier

Por Bruno Zampier

O Brasil nunca ganhou um prêmio Nobel de Literatura. Alías, nunca ganhou um prêmio Nobel de qualquer tipo. Mas o caso do prêmio Nobel de Literatura é particularmente interessante, porquanto permite algumas reflexões a respeito da infertilidade cultural brasileira.

Entre os maiores vencedores encontram-se países europeus, como Franca e Alemanha. Os Estados Unidos frequentemente também marcam presença entre os agraciados. Até aí não temos novidade alguma, pois a teoria que aprendemos a repetir de forma mecânica, é que a população de países desenvolvidos possui maior acesso à educação de qualidade. Ou seja, não estamos entre os centros produtores de alta cultura porque nos falta investimento, falta dinheiro. Somos pobres, somos favelados e isso explica nossa incapacidade literária.

O que não é dito é que entre os ganhadores do prêmio Nobel de Literatura também encontramos companheiros de fracasso econômico, inclusive alguns vizinhos da América Latina. O aclamado prêmio foi concedido em 2010 para Mario Vargas Lhosa, um peruano. Esta aliás, foi a segunda vez que o Peru saiu vencedor, pois em 1982 o agraciado foi Gabriel Garcia Marquez. Naquele mesmo ano “o Brasil inteiro chorou” – não pela vitória do Peru no prêmio Nobel -, mas pela derrota da seleção brasileira para a Itália na Copa do Mundo; o Chile, em 1945 orgulhou-se com Gabriela Mistral; o México, em 1990, com Octavio Paz. Os africanos também nos deixam lambendo poeira: a Argélia, um país devastado pela guerra, foi onde nasceu Albert Camus, vencedor em 1957; a África do Sul, por duas vezes, em 1993 com Nadine Gordiner e em 2003 com John Cotzee. A Nigéria, em 1986, com Wole Soyinka. O Egito, em 1988 com Naguib Mahfouz.

Pasmem, mas até a Guatemala, um país menor que o estado do Paraná, cuja população não passa de quinze milhões da habitantes, já ganhou o prêmio Nobel de Literatura: foi em 1967, com Miguel Angel Austrias. E um outro país, que aliás, nem sabia que existia e nem sei onde fica! Santa Lúcia (onde fica isso???) foi onde nasceu Derek Walcott, vencedor em 1992. E não podemos esquecer da Índia, contemplada em 1913 pela obra de Tagore.

É verdade que Machado de Assis pode ser apontado como um grande escritor brasileiro injustiçado, mas isso não choca tanto quanto perceber que um país com dimensões continentais e a quarta maior população do planeta, não tenha produzido desde 1908 – quando faleceu Machado de Assis – um escritor do mesmo quilate ou superior. Não que o Prêmio Nobel seja assim um atestado de competência intelectual para uma nação, mas precisamos reconhecer que é o maior prêmio internacional na área. Um país com gigantesca população e que preza pela educação, deveria conquistar pelo menos uma vez o dito cujo.

Apesar do fracasso em termos de Premio Nobel, produzimos alguns escritores muito aclamados pela mídia brasileira. É o caso de Jorge Amado, talvez um dos mais conhecidos: várias de suas obras viraram minisséries e novelas da Globo. Entre elas, está o romance “Gabriela, Cravo e Canela” de 1958. Trata-se de uma estória centrada numa moça selvagem e sexy que encanta o homem estressado da cidade. O enredo também esculhamba com a imagem do casamento e retrata a Igreja Católica como um antro de carrascos opressores e hipócritas, sem exceções. Não existe uma personagem mulher que não sofra com o patriarcalismo doentio ou machismo férreo dos personagens masculinos.

Todos os personagens bonzinhos são críticos da sociedade – do casamento, da religião, do machismo, do patriarcalismo e do capitalismo -, e o único intelectual do enredo é um professor bobalhão dado a ler poesias e que só se realiza de verdade quando encontra uma amante ávida por sexo, a qual vive um casamento frustrado com um fazendeiro, coronel e também bobalhão. A partir daí ele larga das poesias, da disciplina e rigidez intelectual e passa a farrear, feliz da vida.

Comunista de carteirinha, Jorge Amado passou longe do prêmio Nobel, mas ganhou o “Prêmio Lenin da Paz” concedido pelo governo de Stálin em 1951. Sim, o ditador mais sanguinário da história da humanidade concedia prêmios da paz, e um dos agraciados, foi um escritor brasileiro cuja obra só tem um objetivo: disseminar a ideologia marxista sob a forma de literatura. A Rede Globo transformou a obra em minissérie e a exibiu por duas vezes, em 1975 e 2012, tornando-se um roteiro modelo para quase todas as novelas da emissora. Nessas estórias, a virtude se resume a ser crítico e revolucionário em algum sentido, não existe meio termo; tudo o que é tradicional é alvo de chacota.

Na esteira das novelas, surgiu o Big Brother, cujo espírito segue a linha ideológica já bem conhecida, permeada de materialismo e hedonismo, mas agora com doses extras de futilidades. Não deve ser coincidência, portanto, que tantos brasileiros se pareçam com os personagens de Jorge Amado. Por orgulho, é claro que ninguém vai admitir que formou sua consciência em novela. Mas nesse cenário patético de Gabriela, permeado de críticas agressivas e levianas contra a religião, onde o ideal mais elevado da vida é uma revolução política, um cargo na estrutura do Estado e uma festa dionisíaca no final de semana, assistimos o medíocre enredo de nossas próprias vidas. De fato, não merecemos premio algum por esta obra, a não ser o aplauso de Stálin.  

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