Humberto Silva Pinho

Por Humberto Pinho da Silva

Subia os Clérigos, quando deparo antigo condiscípulo, companheiro de muitas horas de lazer.

– Há séculos que não te vejo? O que é feito de ti?

– Vivo no interior – respondeu-me o Júlio

– Fizeste bem, há por lá ar mais puro, isento de poluição…

– Não o fiz por prazer – lamentou-se, mostrando fisionomia tristonha.

– Gostava de viver na cidade, onde tenho velhos amigos. O campo não é bom para mim. Gosto de movimento. Sou citadino por natureza, mas…

Explicou-me, então, a triste sina. Reformou-se no início do século. Não era muito, mas ia chegando…

Com o correr dos anos a reforma degradou-se.

Aumentou a renda da casa, substancialmente; aumentaram os géneros alimentícios…. Tudo vai aumentando, menos o que se recebe mensalmente.

Acrescentou, ainda com mágoa: as reformas mínimas têm subido, embora menos do que seria necessário; mas as outras?

O Júlio, desanimado, comentou de voz apagada, estar arrependidíssimo de não ter tentado lá fora, quando era novo:

– Se tivesse emigrado, quem sabe, se não teria reforma mais confortável, para passar a velhice melhor? Quem sabe? Ainda quem recebe duas reformas, vai aguentando, mas eu, que nunca quis que minha mulher trabalhasse…. Sabes? No nosso tempo os homens não queriam viver à custa das mulheres. Era ponto de honra. O marido devia sustentar a família. A esposa era dona de casa: cuidava dos filhos e levava a termo o governo da casa.

Tive pena do Júlio. Embora a minha situação não seja muito melhor.

Bem sei que na aldeia, como disse o Júlio, a vida é mais simples. Sempre há lavradores que oferecem punhado de batatas, mão cheia de feijões, e pinga de azeite.

Mas é triste chegar a velho e não ter fim de vida sossegado e feliz.

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