A 10 de Janeiro – ou domingo mais próximo dessa data, dia do falecimento de S. Gonçalo, realiza-se festa rija em Vila Nova de Gaia.
Penso que todos conhecem, pelo menos vagamente, quem foi S. Gonçalo de Amarante.
O Santo (beato,) nasceu em Tagilde (Vizela) e era sacerdote. Dizem que no dia do batismo, ao entrar na igreja, ergueu os bracinhos para a imagem de Jesus.
Era padre bondoso e caritativo. Um dia resolveu ir a Jerusalém, e para a Igreja não ficar sem pároco, deixou seu sobrinho, que, igualmente, era sacerdote.
Como passassem muitos anos (14,) e não regressasse, o sobrinho julgou-o morto e tomou definitivamente a paróquia.
Levava vida desbragada. Era cruel, e maltratava os pobres e os humildes.
Certo dia, o tio, inesperadamente, regressou. Vinha velho, desfigurado, de vestes sujas e rotas. Para se inteirar como o sobrinho dirigia a paróquia, foi bater à porta da residência, pedindo esmola.
O sobrinho, escorraçou-o, julgando ser um indigente, e soltou os agressivos rafeiros.
Amargurado pelo comportamento do atual abade, S. Gonçalo fez uma choça nas margens do Tâmega, e ai morreu (1262,) orando e fazendo penitencia. Contam-se enternecedores milagres do taumaturgo, como os casos: da ponte, dos touros e dos penedos.
É este santo que é festejado no dia do seu falecimento, em Vila Nova de Gaia, de forma profana e quase pagã.
Pelas nove horas, o grupo, com “zé-pereiras”, dirige-se, em grande algazarra, para a casa onde é guardada a ” cabeça” de S Cristóvão.
Entram as figuras principais, vestidos com trajos, mais ou menos, do século XVIII.
Um, frade, empunhando bordão de peregrino, com cabaça no alto, simbolizando S. Gonçalo, que era, como se sabe, dominicano; os outros, de cabeleira branca, calção, camisa e punhos rendados, casaco comprido e sapatos de fivela ou botas, de borracha, de embarcadiço.
Após entrarem, chegam à janela, para mostrarem, ao povo, a ” cabeça”.
Levanta-se alarido na rua e em uníssemos, gritam: ” O Santo é nosso! O Santo é nosso, e, é, é!”
Segue-se improvisado discurso. De seguida, sempre com a ” cabeça” à frente do cortejo, vão à casa onde se encontra S. Gonçalinho – pequena imagem de corpo inteiro, – e há novo discurso.
Percorre depois o cortejo as principais artérias de Santa Marinha. Pelas cinco ou seis horas da tarde, chegam à igreja de S. Cristóvão ( Mafamude) onde em regra, se encontram com os da “rasa” – Velha e Nova – ( grupos mais recentes que os ” Mareantes do Rio Douro”, que festejam de modo semelhante, o Santo.
Entram na igreja de costas (só as três figuras principais,) fazem oração e saem. O cortejo, então, dá três voltas ao redor do templo, seguindo para a sede do clube. Antes de cada um regressar a casa, há jantarada.
É festa profana, nada religiosa, a não ser a missa celebrada na capelinha do Senhor da Piedade.
A origem dos festejos, segundo reza a tradição, é muito antiga.
O abade de Santa Marinha, indignado com a falta de respeito aos ” santos”, resolveu colocá-los em lugar seguro.
Colocou a “cabeça” de S. Cristóvão numa cesta e tapou-a com alva toalha de linho, e pediu, a mulher, para a levar para o Porto.
Chagando ao rio, esta, solicitou a mestre passador – barqueiro que unia de barco as duas margens, – para a passar. O vento levantou a ponta da toalha e o barqueiro, vendo a ” cabeça”, pegou-a e gritou: “O Santo é nosso! O Santo é nosso!”
Começou, dai, a realizar-se, anualmente, o cortejo, nada religioso, e o povo acompanha, dançando e gritando: ” O Santo é nosso! O Santo é nosso, e, é, é !…”
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