Uma das ideias que mais deformam o caráter de um caboclo e, de quebra, mutila a claudicante vontade de qualquer um, é a sanha de querer ser “original” a qualquer preço ou, ao menos, parecer sê-lo.

Há muitos perrengues que vão se amontoando um sobre o outro quando coloca-se o desejo de ser original como sendo algo digno de nossa atenção e preocupação. O primeiro desses perrengues é que, quanto mais os indivíduos idolatram a tal da originalidade, mais parecidos eles ficam com tudo o que há de mais medíocre nesse mundo. É batata! Basta averiguar para constatar.

E isso ocorre, frequentemente, quando uma pessoa quer porque quer ser “diferentona”, porque ela não quer saber de empreender os esforços mínimos necessários para fazer aquilo que é bom, belo e verdadeiro; ela apenas deseja, caprichosamente, destacar-se no meio da multidão.

Ou seja, por detrás de todo aquele papo de inovação oculta-se, junto com a nossa soberba nada original, uma tremenda má vontade misturada com uma baita egolatria que acaba transparecendo em tudo que seja realizado com esse intento.

Somemos a isso outro ponto, outro perrengue que, por sua deixa, não é menos espinhoso que o anterior. Quando voltamos demasiadamente nossos olhos para a possibilidade “de inovar”, e vemos essa possibilidade como sendo a mais elevada meta que um ser humano pode vir a realizar, sem nos darmos conta, acabamos por colocar essa vaga e insípida ideia de “novidade” no lugar do bem e da verdade que, sem que percebamos, nos leva a crer que tudo o que se apresenta como novo seria, necessariamente, bom e verdadeiro.

Dito de outra maneira, quando fazemos esse tipo de cambalacho, acabamos por abrir os colchetes da porteira para que possa adentrar em nossa vida toda ordem de inversão de valores, de perversão de propósitos e de devassidão de ideias e ideais. E isso ocorre porque, quando colocamos a inovação sentada no trono de critério máximo, para avaliar e julgar tudo e todos, qualquer tranqueira mal-acabada pode passar a ser aceita como sendo válida e digna de apreço, desde que esteja devidamente fantasiada com os paramentos da tal originalidade.

E se o enrosco até aqui já estava feio, calma, muita calma, não criemos pânico, porque há mais um perrengue que gostaríamos de destacar e colocar nesse montinho de encrencas.

É muito comum ouvirmos falar a respeito do quão grande é o progresso que foi obtido pela humanidade com o passar dos séculos, de quão grande é o acúmulo de conhecimentos que foram conquistados até o momento. Todos já ouvimos falar disso, mesmo que nunca tenhamos parado para refletir sobre o assunto. Porém, há um outro fenômeno que anda ao lado deste, que é o crescimento descomunal da quantidade de coisas que vão sendo desaprendidas pela humanidade com o passar do tempo, o aumento colossal de conhecimentos que foram e estão sendo esquecidos por nós.

E o que é mais assombroso é que a quantidade de conhecimentos que foram sendo esquecidos pela humanidade presente é muito, mas muito maior do que os novos conhecimentos que foram sendo produzidos e descobertos nos indos mais recentes da nossa história.

Trocando por moela, ou por qualquer miúdo da nossa preferência, não temos como avaliar de forma serena o real progresso do conhecimento humano se não compararmos com os incontáveis avanços da ignorância e do desconhecimento que acumulamos de forma significativa.

Bem, quando colocamos esse problema diante da idolatria da inovação vemos, com relativa clareza, o quanto isso aprofunda e acelera mais e mais o desdém pela herança cultural que nos foi legada pelas gerações de antanho. Herança essa que, depois de perdida, apenas poderá ser resgatada a duras penas se, é claro, houver boa vontade de nossa parte para realizar essa empreitada.

Resumindo o entrevero, quando cultua-se a vaga noção de originalidade como sendo o “mais elevado valor” que o ser humano pode vir a realizar, sem nos darmos conta, colocamos dois tapumes junto aos nossos olhos que nos permitem apenas olhar para frente, para aquilo que for colocado em nossa frente e, como consequência, acabamos tendo o avanço da nossa ignorância de forma exponencialmente superior ao do progresso do conhecimento, devido ao nosso desdém pela nossa herança cultural que, sem pestanejar, irá nos levar a uma inversão dos valores em misto com uma tremenda perversão dos propósitos e a uma montoeiras de ideias e ideais devassos que, como consequência, levar-nos-á a elevar esses trambolhos no lugar que antes era resguardado ao belo, ao bem e a verdade e, sem percebermos, ao final dessa opereta bufa, nós nos veremos iguais uns aos olhos em mediocridade e perversidade, crendo que estaremos sendo muitíssimo originais em nossa banal degradação.

E, tudo isso, porque nos recusamos a mover alguns esforços para realizar, com um mínimo de boa vontade, a necessária lapidação da nossa torta maneira de ser que, por vaidade, achamos que está mais do que perfeita, e que seria todo o mundo, e não nós, que precisaria urgentemente de correção.

Dito de outro modo: não é que a prática de um esporte, ou de uma arte marcial, seja um trem de outro mundo, não; somos nós que somos indolentes. Não é que os livros de, por exemplo, Machado de Assis, Thomas Mann ou Shakespeare sejam incompreensíveis, não; somos nós que lemos mal pra caramba e, por pura preguiça, não queremos saber de nos submeter a disciplina que pode aprimorar a nossa minguada capacidade de leitura, e assim por diante.

Enfim e por fim, não à toa, nem por acaso, que chegamos ao ponto onde estamos. Não mesmo.

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela

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