Por Bruno Zampier
Nas últimas décadas, diversas alterações curriculares mudaram o sistema de ensino básico. Música e francês, antes obrigatórios, simplesmente desapareceram das escolas, conquanto ainda possam ser encontrados naquelas poucas instituições privadas para crianças privilegiadas. O estudo do latim, antes também elementar e obrigatório, desapareceu por completo.
Em um triste cenário em que o pedagogo comunista Paulo Freire tornou-se o patrono da educação brasileira, a ideologia de gênero vem avançando dia a dia, propondo, entre outras parvoíces, o banimento da flexão de gênero como parte de uma agenda que acredita que o machismo e a homofobia – e não as regras imparciais de um sistema gramatical – estão por trás das terminações com “a” e “o” nas palavras femininas e masculinas. A imposição de tamanho descalabro só seria mesmo possível em um momento histórico habitado por uma geração formada, em grande parte, por analfabetos funcionais. Tal afirmação não é exagerada. Alguns anos atrás, um pesquisador da UNB avaliou 800 estudantes universitários e concluiu que 50% eram analfabetos funcionais. [1] Há quem considere esta porcentagem otimista, afirmando que na verdade 75% dos brasileiros não conseguem ler e escrever de forma satisfatória[2].
Seja lá qual for o número correto, o fato é que a situação é caótica. Mesmo assim, Paulo Freire continua sendo idolatrado como um deus nas faculdades de pedagogia, inclusive porque é o escritor brasileiro mais premiado no exterior, laureado com o Prêmio Unesco de Educação para a Paz. Seu método de ensino, no entanto, não é aplicado em universidade alguma do mundo, e, curiosamente, nem mesmo nos cursos de pedagogia. Entre seus alunos não encontramos também nenhum expoente ou autoridade em educação ou qualquer outra coisa. É verdade que Mário Sergio Cortella foi seu aluno, mas de sua lavra não encontramos qualquer obra de relevo filosófico, exceto palestras (muito caras) em que ele usa de sua figura fofa e simpática para transmitir mensagens de auto-ajuda – retiradas de algum livro de Dalai Lama -, entre piadinhas que fazem a plateia rir gostosamente e lições de ética que não serviriam sequer para um livro de história resumida da filosofia moral.
O sucesso de Paulo Freire se deve muito mais ao fato de que sua tal “teoria” é pioneira em transformar marxismo em pedagogia de forma eficiente, transformando a sala de aula em cursilho preparatório para formação de militantes radicais. Eis a razão de tantas premiações e aclamações: ele deu voz aos partidos políticos dentro das salas de aula, local que antigamente – principalmente nos países latino americanos – eram coordenados por freiras, padres, pastores e famílias. As escolas e universidades, inventadas e fundadas pela Igreja, foram tomadas por uma ideologia pedagógica altamente sedutora. Mas quando escreveu seu Pedagogia do Oprimido, o aclamado autor visualizava apenas a luta de classes e a conscientização dos proletários contra os burgueses. Desde então, muita água se passou debaixo da ponte e atualmente o feminismo surfa as ondas dessa pedagogia revolucionária: mais do que aprender a se revoltar contra o sistema capitalista, agora o estudante aprende também a criticar seus pais, sua sexualidade e sua identidade. E antes de aprender a usar vírgulas e distinguir os tempos verbais, aprende a criticar a flexão de gênero e olhar torto para o próprio pai que acha que tudo isso é esquisito. Logo estará dando lições de moral em casa, ameaçando aqueles que lhe dão casa, comida, roupa lavada e muito cuidado.
Napoleão Mendes de Almeida, um dos maiores filólogos da história do Brasil, e provavelmente um dos melhores professores de latim do mundo, muito escreveu e falou sobre a necessidade do estudo dessa antiga língua como requisito básico a ser exigido de todo estudante. Essa necessidade é praticamente incompreensível nos dias de hoje, e mais parece uma excentricidade intelectual. Mas só é assim porque estamos possuídos pela ideologia freiriana que nos foi imposta na escola desde a infância, segundo a qual o ápice da educação é adquirir um tal “censo crítico” contra tudo e contra todos – a economia capitalista, a Igreja, a família, as regras gramaticais, a própria identidade sexual e a polícia – onde tudo é passível de questionamentos e severas críticas, exceto a parcialidade do professor extremista e a corrupção do partido que ele representa ou endossa com seu discurso.
Mas em outros tempos, naquela época de ouro em que para escrever num simples jornal era preciso ser um monstro sagrado da intelectualidade brasileira – como Machado de Assis, Gilberto Freyre, Lima Barreto e Gonçalves Dias- entendia-se que a educação escolar não tinha por objetivo formar militantes políticos, mas potencializar a inteligência através da alta cultura, alicerce da verdadeira liberdade. Napoleão Mendes de Almeida, narrando sobre a chegada ao Brasil, certa vez, de três eminentes matemáticos de renome internacional – Gleb Wataghin, Giacomo Albanese e Luigi Fantapié -, destaca a carta que os mesmos encaminharam para o então Ministro da Educação que na época ansiava por reformar o ensino secundário:
“Chegados ao Brasil, ficamos admirados com o cabedal de fórmulas decoradas de matemática com que os estudantes brasileiros deixam o curso secundário, fórmulas que na Itália – os três professores eram catedráticos de diferentes faculdades italianas – são ensinadas só no segundo ano de faculdade; ficamos porém, chocados com a pobreza de raciocínio, com a falta de ilação dos estudantes brasileiros; pedimos a vossa excelência que na reforma que se projeta se dê menos matemática e mais latim no curso secundário, para que possamos ensinar matemática no curso superior”[3]
Inclusive o professor Albanese, conta-nos Almeida, costumava dizer: “Deem-me um bom aluno de latim, que farei dele um grande matemático”.
Hoje, poucas pessoas poderão compreender que o maior benefício do latim não é simplesmente auxiliar na compreensão da língua portuguesa, mas muito mais do que isso:
“Quando o aluno compreender quanta atenção exige o latim, quanto lhe prendem o intelecto e lhe deleitam o espírito as várias formas flexionais latinas, a diversidade de ordem dos termos, a variedade de construções de um período, terá de sobejo visto a excelente cooperação, a real e insubstituível utilidade do latim na formação do seu espírito e a razão de ser o latim obrigatório nos países civilizados […] Não é para ser falado que o latim deve ser estudado. Para aguçar seu intelecto, para tornar-se mais observador, para aperfeiçoar-se no poder de concentração de espírito, para obrigar-se à atenção, para desenvolver o espírito de análise, para acostumar-se à calma e à ponderação, qualidades imprescindíveis ao homem de ciência […]”.
Felizmente, hoje crescem os cursos de latim pela internet, muitos deles de altíssimo nível, como por exemplo do professor Rafael Falcón. Queira Deus que aí esteja o nascimento de uma nova geração, realmente culta e inteligente, “acostumada à calma e a ponderação” – para usarmos expressão do professor Napoleão -, e o sepultamento daquela premiadíssima ideologia mentirosa, que pregando libertação, criou lacaios semi-analfabetos, sempre dispostos a alinhar-se nos fronts de batalha dos partidos corruptos. Que o leitor estude o latim, ou pelo menos estimule seus filhos a fazê-lo: precisamos nos rebelar contra a burrice.
[1] Disponível em: https://folhapolitica.jusbrasil.com.br/noticias/113329087/pesquisador-conclui-que-mais-da-metade-dos-universitarios-brasileiros-sao-analfabetos-funcionais
[2] https://portal.aprendiz.uol.com.br/content/75-dos-brasileiros-nao-sabe-ler-plenamente
[3] ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Gramática Latina. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 8.
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