Por Bruno Zampier
Se Deus existisse, Ele poderia muito bem aparecer diante de nós, revelar-se, demonstrar seu poder. Se Ele aparecesse tornaria tudo muito mais fácil. Se Ele existe, por que se oculta? Por que se esconde? Por que envolver-se em todo esse mistério ao invés de simplesmente revelar-se claramente aos olhos de todos? Por que assiste em silêncio ao acalorado debate que atravessa os séculos, entre ateus e religiosos, entre ciência e religião, sem se importar em provar de uma vez por todas sua existência de modo a elidir qualquer suspeita? Gostaríamos que Ele se manifestasse, apresentando-se em todo seu poder e esplendor. Poderia fazer as estrelas dançarem no céu; poderia aparecer diante de nós na forma de um grande dragão ou de uma criança, ressuscitando os mortos, voando pelo céu ou caminhando sobre o mar. Poderia fazer a noite durar dois minutos, criar quatro luas imensas no firmamento, mudar a cor do sol. Mas o fato é que nada disso acontece e os dias se sucedem iguais, Deus permanece em silêncio. Por que?
Esse tipo de dúvida está na mente e no coração de muitas pessoas. E na verdade não é um pensamento nada novo. Deus já vem ouvindo essa crítica há muito tempo. Na Bíblia, os fariseus, que bem entenderam que Cristo estava se intitulando Deus, condenaram-no a pena de morte e enquanto o observavam pregado na Cruz, o desafiavam: “Se és mesmo Filho de Deus, desça da cruz!” (Mateus, 27-40).
No Salmo 22, lemos:
Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? Por que ficas tão longe? Por que não escutas quando grito pedindo socorro? Meu Deus, durante o dia eu te chamo, mas tu não respondes. Eu te chamo de noite, mas não consigo descansar.
Quando Herodes soube que Jesus estava sendo trazido a sua presença, ficou empolgado, porque estava ansioso por ver algum milagre. Certamente havia ouvido que Jesus ressuscitava os mortos, curava doentes, caminhava sobre as águas ou transformava água em vinho.
E Herodes, quando viu a Jesus, alegrou-se muito, porque havia muito que desejava vê-lo, por ter ouvido dele muitas coisas; e esperava que lhe veria fazer algum sinal. E interrogava-o com muitas palavras, mas ele nada lhe respondia. (Lucas 23, 8-9)
Acontece que o primeiro a se ocultar de Deus, na verdade, foi o próprio homem. É o que diz em Genesis. Logo depois de comerem do fruto proibido, Adão e Eva percebem sua nudez e resolvem se ocultar.
Ouvindo o homem e sua mulher os passos do Senhor Deus que andava pelo jardim quando soprava a brisa do dia, esconderam-se da presença do Senhor Deus entre as árvores do jardim.
Mas o Senhor Deus chamou o homem, perguntando: “Onde está você? “
Gênesis 3:8,9
A História da Salvação apresentada na Bíblia, revela portanto que desde o pecado original, é o homem – e não Deus – quem tem se ocultado. É Deus quem anda procurando pelo homem. No entanto, quando o encontra, o homem pede-lhe sinais e prodígios, mas Deus recusa-se, exceto em situações muito excepcionais. Nega-se também a fazer um milagre que seja visto no mundo inteiro ao mesmo tempo. Muito provavelmente, a razão é simples e foi apresentada pelo Papa Bento XVI em uma homilia, talvez no Natal de 2007. Não encontrei a referência para citá-la, mas lembro-me de ouvir essas palavras pela televisão, que nunca mais esqueci e cito de memória:
“Se Deus manifestasse todo o seu poder diante de nós, ficaríamos apavorados e o obedeceríamos por medo. Mas Deus não quer ser temido. Então Ele vem a nós como uma criança, porque deseja ser amado”.
Isso me levou a concluir que manifestações de poder não são a pessoa em si mesma. E isso vale para qualquer um, aliás. Quem vê os talentos e habilidades de um grande artista ou de um grande atleta, não tem a menor idéia de como ele é pessoalmente, na vida diária. Curar os enfermos ou fazer as estrelas dançarem no céu, não seria o próprio Deus. Seria apenas um produto de sua força. No máximo produziria espanto, surpresa, admiração ou mesmo pavor. Deus, no entanto, não está interessado em nos fazer arregalar os olhos. Quando Ele deseja ser conhecido, quer ser conhecido em sua essência, em seu íntimo, e não nos efeitos de seu poder: é que nos explica a Bíblia e a tradição cristã. Contemplar as maravilhas de grandes milagres, seria uma “pirotecnia” irrelevante para satisfazer os interesses de Deus: tornar os homens sábios, virtuosos, bons em essência, caridosos, humildes. Creio ser relativamente fácil compreender que a contemplação de um milagre, não torna ninguém capaz de amar ao próximo ou perdoar uma ofensa. Por isso, Deus quer ser conhecido na oração, no jejum, na meditação, na Sagrada Eucaristia. Desafiar a Deus a se manifestar fisicamente com prodígios, é coisa que os sábios consideram espiritualmente infantil. Aos espiritualmente maduros, cabe desejar e conhecer a Deus “em espírito e verdade”. Na Carta aos Coríntios, São Paulo diz:
Quando eu era criança, pensava como menino, sentia e falava como menino. Quando cheguei à idade adulta deixei para trás as atitudes próprias das crianças. Agora, portanto, enxergamos apenas um reflexo obscuro, como em um material polido; entretanto, haverá o dia em que veremos face a face. Hoje, conheço em parte; então, conhecerei perfeitamente, da mesma maneira como plenamente sou conhecido. Sendo assim, permanecem até o momento estes três: a fé, a esperança e o amor. Contudo, o maior deles é o amor! (1 Coríntios 13)
Diz a Bíblia que haverá, entretanto, um dia em que Deus se manifestará em seu poder, aos olhos de todos, fisicamente. É o que lemos no Evangelho de Lucas. Mas este será o último dia, quando “se completarem o número dos eleitos”, isto é, daqueles que conheceram a Deus em “espírito e verdade”. A manifestação física do poder de Deus causará espanto e terror:
Muitas pessoas desmaiarão de terror, preocupadas com o que estará sobrevindo às populações do mundo, pois os poderes do espaço sideral serão abalados. Então, se observará o Filho do homem vindo numa nuvem, com poder e portentosa glória. Lucas 21, 26-27
Do espanto e do terror, não pode nascer nenhuma caridade, já o sabemos. A alegria do cristão, portanto, nunca será visível para aqueles que só tem olhos e admiração pelo poder e pelas aparências.
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