Foi realizada, neste fim de semana, uma intervenção estética progressista com vista à desconstrução democrática da memória coletiva nacional. Para tanto foram amarrados inúmeros pneus velhos, juntamente com outros materiais inflamáveis, ao redor da estátua do bandeirante Borba Gato para, em seguida, atear fogo nos pneus e, é claro, na estátua do velho bandeirante.
Tal intervenção estética criticamente crítica acabou liberando no ar uma inebriante fumacinha tóxica – porém, democrática – para lembrar a todos os cidadãos da Pauliceia desvairada, e bem como todos os cidadãos de toda a pátria amada, que eles, os autores da façanha, são os senhores da verdade histórica, mesmo que eles digam aos quatro ventos que, no turvo entender deles – conforme aprenderam com seus mestres – não existe esse trem chamado verdade, nem a tal da objetividade. Conforme o iluminado ensinamento aprendido por eles, tudo seria relativo; e que, por isso mesmo, a única coisa absoluta que existiria seria sua vontade por poder.
Bem, é isso o que acontece quando se ensina e defende-se que tudo, tudinho, é relativo: ao invés de termos o império da procura abnegada pela verdade, o que acabamos por obter, no seu lugar, seria apenas e tão somente a tirania dos caprichos ideologicamente desorientados de almas tão corrompidas quanto levianas.
Quando não mais há o respeito mínimo necessário para com a objetividade, o que acaba por imperar não é essa tal liberdade. Nada disso. O que passa a reinar é a arbitrariedade daqueles que são petulantes o bastante para impor, de forma ranheta e violenta, o seu ponto de vista.
Aliás, o curioso é que todos os participantes desse e doutros atentados, similares ao que foi perpetrado nesse fim de semana, vivem – estando online ou não – falando na importância do dito cujo do diálogo, da tolerância e tudo mais. Oxi! Que diálogo é esse que eles estão propondo? Seria, por acaso, um diálogo onde apenas eles falam e todos os demais caninamente concordam? Ao que tudo indica é bem isso que essa gente quer dizer quando fala em tolerância, diálogo, alteridade e democracia.
E o mais engraçado é vermos a velha mídia apresentando o atentado perpetrado como sendo apenas um “incidente” que ocorreu com a estátua do bandeirante. E mais curioso que engraçado é que a mesma velha mídia, sem o menor pudor, rotula sem dó uma postagem politicamente incorreta de um cidadão comum como sendo um “ataque às instituições democráticas”, perpetrado por um “miliciano virtual”, ou algo que o valha.
Por essas e outras que quando perdemos o senso das proporções, com ele, vai-se também a própria razão. E, todo aquele que perde a razão, acaba não sentindo a menor da falta da mesma e, por isso mesmo, acredita estar sempre montado sobre ela.
É importante frisarmos, também, que nada impede que revisitemos o passado e procuremos interpretá-lo, à luz de nossa época e das questões que hoje nos inquietam. Nada impede que procuremos uma interpretação distinta da que até então fora apresentada sobre determinados acontecimentos e personagens que ocupam um lugar de destaque na memória nacional. Aliás, é justamente para isso existe a tal da reflexão histórica.
Em muitos países, por exemplo, após muitos estudos, debates e discussões, certos monumentos que, hoje, não mais são vistos como sendo representativos dos valores da comunidade, acabam sendo retirados de seus pedestais e são devidamente levados para um museu ou arquivo/depósito, pois, enquanto monumentos, eles são um documento histórico que reflete a mentalidade de uma época e bem como o processo de formação da sociedade. Destruí-los seria o mesmo que mutilar a própria sociedade.
Agora, essa folia desvairada de sair derrubando, depredando e queimando monumentos históricos, porque supostamente não são representativos deste ou daquele grupo politicamente instrumentalizado, não é coisa de gente séria não. Não mesmo.
Todo aquele que tem essa barda, de querer reescrever a força a história, destruindo a herança recebida e remodelando-a de acordo com os interesses ditados por ideologias políticas totalitárias, dificilmente irá oferecer bons frutos para as gerações vindouras.
Um bom exemplo desse tipo de perversão, foi a Revolução Cultural Chinesa, que é ovacionada como sendo um grande acontecimento pelas alminhas criticamente críticas. A referida revolução pintou e bordou, derrubando monumentos históricos, mudando nomes de ruas, fazendo o dianho com tudo e com todos para realizar finalidades que nada tinham que ver com a ampliação e o aprofundamento da consciência histórica das pessoas. Tinha sim, com a manipulação e mutilação das consciências individuais.
E vejam só como são as coisas nessas terras cabralinas: a empresa Brasil Paralelo, com seus documentários, produzidos à luz da reflexão de seus integrantes e convidados – reflexões essas motivadas pelas questões que os inquietam – procura apresentar uma interpretação sobre a história de nosso país e a respeito de alguns personagens que ocupam um lugar de destaque na nossa história e, fazem isso, sem utilizar um centavo sequer de dinheiro público e, principalmente, sem depredar o patrimônio histórico da nossa triste nação.
Porém, essa empresa é tratada pela velha mídia como sendo uma propagadora de Fake News; e rotulada com uma penca de outros adjetivos fofos; raramente ela é identificada por aquilo que ela de fato é.
Então não se pode discordar do trabalho que é realizado pela Brasil Paralelo? Pode. Pode sim senhor. Mas com honestidade intelectual, não com malandragens retóricas. Da mesma forma não podemos, de jeito algum, concordar com a destruição de um monumento histórico; não podemos nos dar ao desfrute de recorrermos ao uso de malabarismos histriônicos para tentar justificar o injustificável.
E não é uma questão de concordância ou discordância. Nada disso. Pessoalmente tenho minhas ressalvas a alguns trabalhos realizados pela Brasil Paralelo, e não sou poucas, como também sou um caboclo cônscio da exagerada idealização que existe em torno dos bandeirantes e do quão feia e de mau gosto é estátua do tal Borba Gato. Porém, tanto num caso como no outro, depreciar levianamente o trabalho dos primeiros e destruir de forma vil um ícone como o segundo, não nos torna uma pessoa melhor, nem nos deixa mais inteligentes.
Na verdade, a depreciação leviana e bem como a destruição mefistofélica, apenas revelam o tamanho da ignorância presunçosa que habita os nossos corações se, porventura, somos como aqueles que realizam esses atos, ou se somos da turma daqueles que acham toda essa baixeza uma coisa linda de se ver.
É isso. Fim de causo.
Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela
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