Calar, muitas vezes, acaba sendo o melhor remédio que há. Na grande maioria das vezes, para ser franco.

Existem inúmeras razões para isso, principalmente numa era em que falar tornou-se algo tão fácil e, por sua deixa, parar para ouvir, pra prestar atenção no outro, algo tão difícil.

Nisso, penso eu, por si só já é um forte motivo para reduzirmos nosso ímpeto de parlar pelos cotovelos.

E o mais curioso nisso é que para podermos falar bem, seria preciso que, amorosamente, nos dispuséssemos a ouvir bem.

Tendo a ter a impressão – e por ser uma mera impressão posso estar redondamente errado – de que no mundo contemporâneo, realmente, desaprendemos a ouvir atentamente e, é claro, a refletir sobre aquilo que foi ouvido [levianamente por nós].

Para fazermos isso, ouvir atentamente e refletir devidamente, precisaríamos dedicar algum tempo a algo que não fosse apenas um reflexo pálido de nós mesmos; seria preciso nos interessar sinceramente ao que está sendo comunicado a nós por alguém bem diferente de nós.

Talvez, por isso mesmo, no mundo atual exista essa severa limitação de nossa capacidade de atenção.

Não são poucas as pessoas que se impacientam diante dum livro, dum filme longo ou de um vídeo/podcast extenso.

Muitos não conseguem parar, sossegar. E se param, precisam interromper o seu diálogo com a obra [com o outro] para dar uma olhadela naquilo que está boiando nas águas superficiais das redes sociais que, ganham nossa atenção na medida em que o que esteja boiando seja tão frívolo e fugidio quanto nossos interesses.

Dá-se a impressão que frente ao oceano de informações ficamos sem reação e, por isso, acabamos vislumbrando apenas duas possibilidades. A primeira seria a de querermos abraçar tudo o que vemos pela frente e, por isso mesmo, ao final, ficamos com praticamente nada em nosso coração. A outra, a de nos contentarmos com qualquer coisa que chegue até nossas mãos, pouco importando o que seja.

Dum jeito ou de outro, seja qual for a possibilidade que abracemos, essas escolhas impensadas e impulsivas acabam por refletir muito sobre a egolatria que impera em nosso coração.

Chega ser cômico pensarmos que numa época em que temos instrumentos que nos permitem ter acesso a tantos bens culturais nós consigamos a façanha de sermos pessoas tão superficiais e instáveis.

De mais a mais, penso que muita dessa falta de profundidade e amplitude se deve a essa nossa inépcia para aquietar, para silenciar o alarido que habita nossa alma e podermos, atentamente, ouvir o que está para além das cercanias de nosso mundinho.

Talvez aí resida a razão que acabe levando tantas pessoas a imaginarem que o “eu acho sobre tal coisa” seria mais importante do que a própria coisa.

Não que nossas interpretações sobre algo não sejam relevantes. Não é disso que se trata.

O problema é que uma interpretação apenas tem valor quando nós realmente nos esforçamos para compreender o que está sendo objeto de nossa interpretação e, para tanto, precisamos, humildemente, reconhecer o que a realidade é mais ampla e complexa que a realeza de nosso umbigo que insiste tanto em previamente rotular tudo aquilo que soberbamente desconhecemos.

Precisamos reconhecer para anos mesmos que é necessário que saiamos do picadeiro de nossas preocupações e coloquemos o outro, a realidade, no centro de nosso coração para, amorosamente, dar-lhes a atenção que nós, até então, dávamos prioritariamente aos nossos desejos e impulsos desordenados.

Para não mais tomar o seu tempo, repetimos o que havíamos dito no princípio dessa escrevinhada: calar é preciso. Urge silenciarmos nosso alarido interior para melhor ouvirmos os outros e, desse modo, lapidarmos nosso discernimento que, ultimamente, vem sendo tão vilmente mutilado por nós mesmos.

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela, em 24 de março de 2020, dia de Santa Catarina da Suécia.

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