Eu queria tanto ser gostosa.

Sabe aquelas gostosonas das coxas grossas, bumbum na nuca, barriga chapada e costas absurdamente definidas?

Sabe, não sabe?

Então, dessas mesmas.
Mas, apesar de todo o meu esforço, de malhar, comer direitinho, beber isso e não beber aquilo, nada acontece.

Assim, todo meu esforço é modo de dizer, às vezes, eu cometo alguns deslizes…

Como quando me dá aquela fome desesperadora que eu já tentei matar afogada com água pura, enganada com uma castanha ou asfixiada com uva passas e a maldita continua gritando.

Quando isso acontece e ainda não é hora de dormir, vou lá e como uma pizza metade peito de peru com queijo cheedar, metade chocolate.

Depois disso, a bicha morre e eu, bem, eu quase morro junto.

Outra hora, acordo cedo no domingo para começar a semana malhando.

Descanso da malhação no sábado, então, domingo às nove, quando a academia abre, quero já estar lá na porta.

Malhar no domingo é certeza de malhar a semana inteira.

Aí, justo quando todos os meus planos apontam para um começo de semana produtivo, amanhece uma chuva, um vento, um frio e eu me lembro de que aquele é o único dia da semana que terei a chance de acordar um pouco mais tarde.

Viro para o outro lado e começo a sonhar com a academia.

E, quando levanto, ao meio dia, encontro um lindo domingo de sol e um misto quente acompanhado por um copo gigante de leite com chocolate.

E vou mastigando e sentindo o perfume da lasanha de domingo, ouvindo o som do leite condensado se juntando ao creme de leite e aquela sobremesa maravilhosa e inesquecível nascendo bem ali, ao meu alcance.

No outro dia, depois de uma verdadeira orgia gastronômica, a coragem para ir malhar já é muito, muito menor que a da manhã chuvosa e a vontade de comer, gigantesca.

Passo a semana entregue aos prazeres: muita comida, zero exercício.

Vejo tudo que ganhei ao longo do último mês de dedicação e esforço se esvaindo.

Até que um dia tiro coragem nem sei de onde e volto à academia.

Malho um pouquinho e saio de lá tão dolorida, mas tão dolorida, que fico mais três dias sem aparecer.

É…

Se essa é minha realidade não tenho feito assim tanto esforço.

Cara de pau a minha pessoa.

Essa é minha realidade: não tenho feito esforço algum.

Não sei o que eu faço, queria só uma coisa: que minha vontade, meu apetite e minha disposição combinassem com o desejo que tenho de ficar gostosa, que eles fossem amigos.

Por que a culpa nem é minha dessas coisas acontecerem, a culpa é da minha gula e preguiça serem muito maiores e mais fortes do que a minha vontade da ficar gostosa.

Bem que a vontade podia ser maior, mais forte.

Se isso acontecesse, tudo ia ser bem mais fácil.

Vou sentar bem aqui e esperar que elas se entendam.

Depois, vejo o que faço.

Vivi Antunes é ajuntadora de letrinhas e assim o faz às segundas, quartas e sextas.

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