Hoje eu acordei querendo brigar.

– Com quem?

Sei lá. Eu quero brigar.

– Por causa de quê?

Não sei. Eu quero brigar.

– Você vai sair à rua querendo brigar desse jeito?

É. Vou cuidar da minha vida normalmente, o primeiro que pisar no meu calo eu brigo.

– E vai de carro?

Claro!

– Vai para o trabalho?

Vou! Já disse que vou cuidar da minha vida normalmente.

– Então deixa eu ver se entendi: Você hoje acordou querendo brigar. Não sabe por quê, não sabe com quem, não sabe pra quê. A única certeza que tem é que quer brigar. Certo?

Certo?

– Compreendi.

O que você compreendeu? Será que vou ter que começar a brigar antes de sair de casa?

– Não! Claro que não!

Então eu vou embora. Tchau!

– Espere! Preciso me despedir de você.

Despedir de mim? Como assim?  Não vou viajar.

– Claro que não! Você não vai viajar, vai morrer!

Vou morrer?

– Você vai sair de casa com esse espírito guerreiro sem causa nem inimigo, querendo brigar com qualquer um que passar à sua frente e pior: vai dirigir nesse trânsito maluco! Mesmo assim acredita que vai terminar o dia viva?

O silêncio que havia terminado com o despertador volta instantaneamente.

Será?

– Certeza!

Melhor eu repensar minha vontade de brigar. Já pensou se eu encontro alguém armado com mais vontade que eu?

– Você morre.

E se eu achar para brigar alguém muito maior que eu?

– Você morre.

E se além de maior, armado e com mais vontade ainda for uma pessoa com mais raiva que eu? Tudo mais que eu?

– Eu já disse: você morre. Por isso estou me despedindo da sua pessoa.

Minha vontade de brigar passou. Vou tomar um banho gelado, dar uns gritos enquanto me lavo e ir para o trabalho, de metrô!

Vivi Antunes é ajuntadora de letrinhas e assim o faz às segundas, quartas e sextas no www.viviantunes.wordpress.com

 

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