Por  José Carlos Correia Filho*

‘Não existe país com governo corrupto e população honesta’, diz historiador da Unicamp (SP), Leandro Karnal.Essa frase nos demonstra que num país onde o povo é totalmente honesto, o governo não poderá ser corrupto, ou pelo menos os governantes terão mais dificuldade em praticar atos ilícitos.

 

No Brasil, o povo é totalmente honesto? Olhando para nós mesmos, para nossas ações, essa resposta seria sim ou não? Bem, o que temos observado nas conversas do dia a dia, e especialmente das redes sociais, é um surto de moralidade da maioria das pessoas. Bradam por justiça, por punição para políticos corruptos (comprovadamente ou nem tanto), e exigem providências. Na alça de mira do momento, o caso do julgamento do ex-presidenteLuíz Inácio Lula da Silva, caso que faz com que milhões de pessoas se manifestem e comemorem como se o problema da corrupção no Brasil estivesse sendo resolvido por completo.

 

Cabe ressaltar que não desejo aqui defender a condenação ou a absolvição do político citado. O fato é que parece que o povo, a mídia, alguns políticos, instituições religiosas, etc, todos foram tomados de um surto de moralidade jamais visto neste país, uma sede de justiça, de decência, de probidade, de integridade sem precedentes. Tal surto chegaria a ser inspirador, caso fosse realmente verdadeiro.

 

Mas, enquanto povo, como ficam as nossas pequenas corrupções diárias? Elas vão cessar? Furar uma fila; ficar com algo que não nos pertence, mas fora encontrado (e “achado não é roubado”); dar o “cafezinho do guarda” ao ser  flagrado em descumprimento das leis de trânsito; estacionar em local proibido ou em vagas reservadas “só por um minutinho”; burlar regras simples do dia a dia, tentando obter pequenas vantagens chamadas de “jeitinho brasileiro”. E aí, cara pálida seu surto de moralidade ainda está firme e forte, ou você já começa a sentir um certo cheirinho de hipocrisia, de demagogia no ar?

 

Claro que pode te parecer exagero comparar um ex-presidente envolvido em escândalos de milhões com um simples “jeitinho brasileiro” que você usa lá de vez em sempre né? Ok, mas a gente sabe que roubo é roubo (não tem menor nem maior). Mentira é mentira, falsidade é falsidade, concorda? Se nós, o povo, fossemos corretos em tudo, para começo de conversa, não votaríamos em políticos com a menor mancha em seu currículo. E não venderíamos nossos votos em troca de gasolina, cestas básicas, empregos para um parente, ou coisas do gênero.

Mas vamos lá, desconsideremos então nossas escorregadas “inofensivas”, e fiquemos só com os políticos corruptos que merecem ser presos, punidos, todos eles e tal… Todos eles? Essa sua indignação estava onde quando:

  1. Nada aconteceu com os envolvidos no Mensalão (lembra?), aquele do Roberto Jefferson. De 40 acusados só três foram cassados, ninguém preso, Jefferson reeleito.b) Os Sanguessugas foram descobertos, superfaturamento em compra de ambulâncias, enviadas aos municípios. Nenhum dos três senadores e 70 deputados federais envolvidos no caso perdeu o mandato. Nada!c)Sudam: Dirigentes da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia desviavam dinheiro por meio de falsos documentos fiscais e contratos de bens e serviços. Dos 143 réus, apenas um foi condenado e recorre da sentença. Jader Barbalho, acusado de ser um dos pivôs do esquema, renunciou ao mandato de senador, mas foi reeleito em 2011.
  2. Sem falar de escândalos com aeroportos em Minas Gerais (Aécio Neves), malas de dinheiro entregues em restaurantes, apartamentos abarrotados de dinheiro (Geddel), Vampiros da Saúde, Banestado, Banco Marka, TRT de São Paulo, Anões do Orçamento, e tantos outros O “grande acordo, com o Supremo com tudo”, do Romero Jucá. E a Operação Quadro Negro, aqui no Paraná? Tenho certeza que alguns você nem tinha ouvido falar. Já parou para pensar que certos escândalos aparecem mais que outros? E que a Justiça funciona rápido em alguns casos, porém insiste em não funcionar de jeito nenhum em outros casos? Isso lhe parece correto? Sua indignação foi provocada nestes outros tantos casos, ou você não teve um canal de TV ou um aplicativo de Internet que lhe desse essas informações?

Portanto, vamos retomar: 1. Sua indignação com a corrupção, sua sede por transparência, justiça e probidade só é válida se, verdadeiramente em seu dia a dia você for 100% correto em seus atos, abandonar todos os vícios da busca por facilidades e “jeitinhos”. Caso contrário, é hipocrisia amigo. 2. Se você se rebela contra a corrupção apenas nos casos em que a mídia lhe ordena, mas se faz de cego, surdo e mudo perante TODOS OS DEMAIS casos que estão acontecendo no Brasil, você é apenas um fantoche nas mãos de um canal de televisão ou de grupos com interesses próprios.

A luta contra a corrupção deve ser de todos, contra todos os corruptos, com a mesma intensidade. Deve iniciar em nossas atitudes pessoais, e não ser apenas colocada em prática para seguir uma moda ditada por algum canal de tv ou página de rede social que serve a certo interesses ocultos.

*Professor de História

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